A5 r -^Iv r^ l}l i PBplicate Releíí^íea 3lírlm (íítrkr 0w\t> fôlmmt ^^ZoUvf LIBRARY ofthe UNIVERSITY of TORONTO ITALIA-ESPANA The Gift The Associa The John Cárter B 9^" \ EX-LIBRIS M. A. BUCHANAN '^^Jè^J^ ^.^^^3-iSL^ 0.^t4^ ,.^UlAa^_X.^ -^^■tf-tH.W-t^' -x.-u-t^-^ /^ a^-^í-^^-^ Crt^Y^^^J^ C^ /S^^>L^> I ^LdU.,^2iyi><:a. T-^^^-^^-ÇAc^ '7<'^^ca*^^^Ío>CV^>c TRATADO DAS BATALHAS , E SUCESSOS DOGALEAM SANTIAGO Com os OlandeXes na Ilha de Santa Slena, EdaNao Chagas cotn oslnglezes entre as Ilhas dos Açores: ambas Capitanias dacarreyra da índia, & da caiira,& defaftres, porque €11) vinte annos íe perderão trin- ta, &oyto Nãos delia. Bfcrito por 5\<íelchÍQr EJlacio do AmaraL NaOíficina deAntonio Alvares. ^o/lnnode lóOf, K A DOM THEODOSIO CONDESTABRE DE PORTVGAL, . Duque da Cidade de Bragança , & de Barcel- los , Marquez de Villa Viçofa , Conde de Ourem, fenhor das Villas de Ar- rayoIlos,& PorccK NT RE, trinta é* oyto nãos da Índia ÇExcel- lenttjjimo Príncipe. } G^tte ejie Reyno perdeo em obra de vinte annos^y houve em atgumasJuce£os tao famofos , é^ dignos de notar , que me move* ral) relatar parte delles nefie breve tratado , que com devido acatamento offereço a V. Excelíemia : Por rnepa-" recer-i que tanto fentira ecUpfarfe à nação Portugueza ( com taes perdas ) a gloria com que floreceo nejt a navega çad ^ é* conqutfia que emprendeo (^principalmente no tempo dofelmjji^ mo\ & inviBiJJimo Rey Do7?i Manoel vojfo vi favo ) quanto ejlimara todos Jhu bons fucejfos, E que nao fo aos que efca-^ fàraÕ dos que refiro , rejultarkgofto defem trabalhos , venda que chegarão k noticia de V. Excellencia , mas eterna fmmo' ria dos que nelles acabarão gloriofamente. Receba V ExceU lencia comfua cofiumada affabtlidade efta pobre relação de mi- nha mao rude^ó* tndoEta , para que fique ella amparada , ó* defculpado meu atrevimento, Deos guarde a K Excellencia* De Litsboa 30. de Novembro de 1 604. Melchior Eftacio do Amar ah t 2 Vi T C'IIftete0.€{ia(J3as MtVíhái, 8è fu. ,V. ceííos do Galeão Santiago, & da Náo Chagas , não tem coufa por onde fe não poíía infiprimir.Ení São Domin- gos de Lisboa i8.de Outubro de 160+J Frey ManoelCoe/iro^ Vljla a informat^ão , póde-fe imprimir ejle tr atado, <&- depois de imprejjo tor- ne a ejle Confelhopara fe conferir com o ori- ginal > O-fe dar licença para correr , (s^fem ella }iíí& correra. 8m Lisboa a 27 • de OutU'^ hrodeióo^. - Marcos Teyxeyra. Ruy Pires da Veyga. VIfta a informação ofFereeida do Padre Frey Manoel Coelhó,pò- de-fe imprimir efte tratado. Lisboa 30. de Outubro de 1604. SiiMÕBorges. ■(^gg^ " ' s^^' G^^ «aS5w> (MÊaN^ e€3^2> . e^^^ <2^^^ Doprepojíta defie tratado. SSIMeomo nas obras naturaes , nunca enten- de a natureza fazer alguma de balde, antes em todas leva fempre rcfpeytoa algum fim prc- veytofo. Affim guiado eu de natural compay- xaò dos que no mar paíTaô trabalhos , ôc for- tunas C pelas em que nelle muytas vezes me vi) defejando com o favor Divino, que defte meu pequeno trabalho , 6c breve tratado ( que efcrevi pelas mais verdadeyras infor- maçoens que aehey de peíToas de credito , & authoridade} tirem algum trutoosque continuaôa perigofa , 6c traba- Jhofa carreyra Oriental , em que a experiência dos vários fuceíTos delia (alcançada tantoácufla de noiTa naçaô Por- fugueza , 6c de tantos , 6c taô a ílln alados Varocns que ffcTla perecerão ) tem enfinado mais que a natural Filoío- fia, 6f grande engenho dos famofos Mathematicos , &• Cofmografos , que delia efcrevéa^aó íem a verem. E pofto que a liçaõ dos rerriveis efpedaculos, 6c caíos deztftrados da fortuna, naô dá alivio , antes compayxaõ , fempre he perda ficarem fcpultados no efquecimento do tempo , 6e Carecerem os futuros da verdadeyra noticia dellès, efpeci- almente dos que faõ tão memorandos , como o facccíTo do Galeão Santiago eom os Olandezes na Ilha de Santa Elena,no armo de i6o2.6c o da Náo Chagas com osln^^le-^ zes nas Ilhas dos Açores no annode 1594. Capitanias am- bas defta navegaçào. Sobre q^ue me difpuz a eícrever eíle tratado. Porque quanto a mim faô mais horrendos, & dig- nos de eterna nocicia , que quantos fucedéráo nella desde que ceve principio até hoje que ha 194, annos , como po- dem cotejar os que tiverem Udo as hiltorias Oriencaes. E fe oscuriofos que as não lerão, &c lerem efte tratado , o quizerem ver ; Para iflb lhe recito aqui todas as que fao eí- critas, & tem fahido a luz até efte prefente anão de 1604. & porellas verão também ò$ eroteos das armas Porcugiie- zas pugnando pela Exaltação da Santa Fé Catholica con- tra toda a potenciados Impérios, 6c Reynos Oriencaes: Sc como tem avaíralladosáMonarchica Coroa defte Reyno,, perto de quarenta Reys Coroados do Oriente. Veráo mais pelas ditas hiftorias,a Florefta Celeílial pela redon- deza do mundo , do Sagrado Evangelho , 6c com quanta gloriadenoíToSenhorJefuChrifto triunfa a Santa,& Ca- tholica Igreja Efpofa fua, até as mais remotas partes da ter- ra , contra todo o poderio dos infernos. E por efte pobre tratado, os que não entrarão no mar,colligiráò pelos muy- tos naufrágios , neUc referidos , & fucedidos nefta carrey- ra,&: pelas caufas , Sc dezaftres dellcs , quão caro cufta tudo o que fe traz da Índia , Sc como a cobiça pôde mais que todos os temores. Acharão nelle também coníolaçaõ, aquelles a que acontecerem menores , ou femelhantes fu- ceíTos, ( de que Deos os livre) para terem nelles paciência, & fe advertirem, Sc prevenirem quanto for poífivel , con- tra lemelhantes calos advertindo-fc , nos que tanto á fua cufta os experimentarão. Cánãohe nenhum tão experi- incntado nas coufas do mar, Sc da guerra, quelhenâo fe- janeceíTario advertirfede muy tas mais, peia variedade, & incerteza delias* AUTHO. AVTGRES CLUE ESCREVERA!^ das coufas da navegação, & conquilia, & pré- gagaõ do Sagrado Evangelho pelos Por- tuguezes , nas índias Oricncaesj China, &Japaõ. Oab de Barros t três Décadas , hifioria geral. Fernão Lopes de Cajlanheda , ht/torta geral. Domjeronjmo Oforio Bt/podo Algarve. Chr^- nica deURey Dom Manoel, Damião de Gou* Outra Chronica do mefmo Se- nhor Rey. Jlníomo Galvão -^hijloria geral. João Pêro Maphto^ Padre da Companhia de Jefuy hifioria^ girai. O Itvro das cartas dos Padres da Companhia de Jefu: O Padre João de Lucena da Companhia de Jefu : Da Vida do^ Padre Francifco Xavier. O Padre Luú Guzmao da Companhia de Jefu^ hiportn^ Garcia de Refende Chromca deURey Dom Joaô oIL Marco Pollo Veneto : hifioria. Fr* António de Sao Romão Placenciano frade de Sao Bentas hifioria geral, & moderna, mupo curiofa, Luís de Camões Poeta Por tuguez Lafiadas em oytava. O Padre Fr. João Gonçalves de Mendo ça ^ Agoftwho htftovw da China, O Padre Dom João Ber mudez , hifioria da Ethioppiãi Pêro de Mefqmta yamefma hifioria da Ethioppia. O Padre Francifco Aher es a hifioria do Prefie João:. © Padre Frey Gafpar Dt minico , hifioria da China, fmeMano dasfaçmhas do gr ande A^onfo de Albuquerque. '" Lopp Loppo de Soufa Coutinho , oprimeyrocerco de Dio^ '^ \J fi^ Francifco de Andrade^ outro cerco de Dio. ^ Jeronymo Coi te Real ^ cerco de Dio. Diogo de Jeve-^ cerco de Dio, George de Lemos^ cerco de Malaca, Antomode CaJitlhQ^ Comentário do arco de Goa, Comentário das coufas do Vifo-Rej D. João de Cajlro. António Pmto^ as coufas do l^ifo Rey D. Luís de Ataíde. Pedro de Maris^ hftoria. Bernardino Efcalate^ hijloria. Viagede Ludii vico Patrício Romano. . ,^ , jeimjimo Corte Real^natijrt^giõ de Manò^..il^§ou^^^^ vef- fo folto. '■ ~ \ Tires naufrágios das Nàos Sfojúao^ Santi^ Maria di{,B^i;^i ..^ &Sao Paulo. ,,j v>^ '^t^^'^i\<^i^o^;j. " - Manoel de Mefqtiíta^ naufrágio da Nao S. Bento. Naufrágio da Nao Conceyçao a Algaravia a Nova nos iay^r xos de Pêro de Banhos. ManoelGodmhO)naufragio da Nao Santiago, João Baptijla Lavanha^ naufrágio da Nh Santo JlheriQ.-. Diogo do Couto guarda Mor da Torre do Tombo do Eflado d^ Indiana quarta Década. Alg»s Capítulos tirados das Cartas dos Padres daCompa- nhiaypelo Padre Amador Rabello, Jornada do Arcebijpo D. Frey Aleyxode Menezes. Por Fny .; António Gouveao Ethiopia Oriental por FreyJoaÕ dos Santos da Ordem do€ Pregadores, .1 Peregrinação de Fernai Mendes Pinto , em que da conta de muytas, & muy efiranhas coufas que vwno Rey no da Chi- na ^c^ outras partes da ludia. Pag.i. TRATADO DAS BATALHAS, ESUCESSOS^ Do Galcaô Santiago 3 com os Olande- zcsnailha de Santa Elcnano annodc 1602. CAPITULO PRIMETR o. De como partindo no anno de iGoi, nove Nãos de Lisboa jp^- ra a índia arribarão. E da volta que fez a Capitania Santiago da índia , ér pareceres que nelle houve de nae tomarem a liba de Santa Etena. O Anno de 1601. mandou ElRey noíTo Senhor que além das três náos de viagem da carreyrada índia , de que naquelle anno hia por Capitão Mòr Dom Francifco Telío, íe apreílaflem fcis Galeões para paílarem à índia com íbccorro de gente , mu- nições, & dinhey ro , de que fua Mageftade enten- de© que aquelle Ettado carecia , ou pela perda que ouve nelle no aflalto do Cunhalle , ou pelos refpey tos que a iílb moverão ao dito S-nhor. E ordenou que dos íeis Galeões do foccorrofoíle por Ca- pitão mòr António de Mello de Caftro , que já duas vezes tinha hido por Capitão mòr das Náos da dita carreyra. E porque fenão poderão aprcftar tantas Náos para fahirem juntas cm húa maré, as foraó lançando aífira como fe poderão avinr. Sahio António de Mello a 1 1 . de Abril com cinco Galeões de fua companhia com a fua Capitania por nome Santiago , & levou comâgo as frotas de Guiné, 6c Braííl , que largou em fuás paragésfeguras de coílarios, que havia muy tos na coíla. Os quatro Galeões eniõ Saõ Joaó , o Salvador , Saõ Matheus, & Santo António. Sahio cm vinte de A- bril Dom Francifco Tello com duas Náos das fur^s três , Saõ Ja- cinto Capitania, 6c Saõ RoqUv . E a zy. áo mt:ímo Abiil , fahiraó , A os Ga- ^ • Trotado do fucejjo os Galeões nofla SenhoiM cia Eigonhi da compvinhia de António de Mello, & SaóSimaõ dacompanhia de Dom Francilco. E nefta fornia foraõ lançadas eíle ánno de Lisboa nove Náos para a Índia.' Porém como naó partirão em Março, quehe a natural monçaõ defta carreyra, tornarão arribar cinco da linha onde á monçaô íe lhe adiantou Dom Francifco com ns fuás trcs Náos , Sc o Galeão Bigonha da companhia de António de Mello, 6cSa5 Matthcu?, <]ue pollo que fahio com cUe, por muyto zorrcyro fiou ftndo o ultimo de todos. Paflbu António de Mello com os quatro, de que a Goa chegarão fó três com toda a gente bem difpoíta, pofto que a Capitania cfteve perdida no Parfal de Sofalla. O Galeaõ Santo António na paragem das Ilhas de Triílaó da Cunha , encontroufe com a Capitania, & depois de fe faudarem, 6c que hiaó todos bem, fe apartou dcIla para fempre , porque deu á cotia em Sacotorá, 6c perccco quafi a gente toda, 6c o Capitão Manoel Paes da Vcyga, que efcapou fe embarcou para Goa com fua mulher, filhos, 6c húa Cunhada , ôc algús que efcapáraó do naufrágio , & naó apparcceo mais, dizem que o mar os comeo. Os três que chegarão a Goa , fo« laó^muytoieftejados pela falta que na índia havia,quanto fentidos- 3iaõ chegarem lá as mais Náos.E porque o Galeaõ Capitania San- tiago fenaõ fez para a carreyra da índia , fcnaõ para Armadas dO' I^- yno,6c crafranfino para carregar , lhe lançarão em Goa hum antre coílado : Donde fc pnrtio para eíle Rcyno , dia de Natal em que fe começou a era de i6ox metido no fundo do mar com car- ga, como collumaõ partir daqucllas partes as Náos de fua carrey- ra ( mal irremediável , & que taõ caro cuíla a muytas delias ) tra- zia eíle Galeaõ fó no poraõ quatro mil quintaes de pimenta, & no corpo da Náo, & debayxo da ponte , & encima delia, na tolda, no capitèo , fobre o batel , no fitio do cbreílantc , no convés^, cr-.o. tantos os cayxões de fazenda , ôc firdos ao cavalete , que ii;*ó cabia >iúa peíToanellci Eatè por fora do cortado pelas polliças , 6c me- las de guarnição, vinhaõ fardos, & camarotes formados , como todas cilas N aos coílumaõ. De tal maney ra, que fenaõ podia ncl- le marear as vell is, ôc dezoy to dias fcnaõ pode andar com o cabre* ftante. E fobre tudo fe embarcarão nellc perto de trezentas almas entre nautas , officiaes , £c algús foldados ordinários, & cfcravos, & como trinta pcíibas fidalgos , & nobres, convém a faber. O Pa* ' dre D^ Galeão Santíúígo. íj ^dreFr. Feliz Pregador da Ordem de S.mto Aguftmho, que foy ^Prior eiiiOrmuZjDom Pcro Manoel irmaõ do Conde da Atalaya, ^Dpm Fcíippe 4c Soufa , Dom Manoel de la Serda , Francifco de , Mello de Caftro.filho do Capitão mòr, Ray Pereyra,Simaó Fer- . rêyra do VaUe, Duarte Barbofa de Alpoem , i^lvar.o Velho, Joaõ ' Falcaó, Fernaó Horciz de Távora , Pedro Mexia , Ôç outros. Ví- iaha tal o Galeão, que por n í6 poder iiwegar , ordenou o Capitão '.pior com parecer dos mais, que o que fe havia de alojar com qiial- , quer pequeno tempo , Te alojaíTe cm bonança , que lenáo efcufa- va para o Gal::aó ficar marinheyro : 6c aílim fc fez obrigando-íe r todos ás avarias do alojado , porque era de marinheyros , ÒC gru- ;, metes pobres. E caminhando na vokade Moçambique , como ^ trazia por regimento o naó podòraó tomar com o vento contrario ■ para ifto, & bom para feguir viagem : Em tal iorma que com to- , do o pano encima, 6c velas de gávea paílaraó o cabo de bo.\ Efpc- rança em vinte êc cinco de Fcvcreyro com tanta bonança,6< pra- ; zer qual ate aqudle tempo naó paíláraNáo outra alguma : De tal .modo que parcceque enfadada a fortuna de fua profperidade, os ^apreílava pelo chegar ao termo infeliceem que cedo o veremos, .Quandofeyiraõdeílabandi cumpridos osdefcjos da boa efpe- - rança , começarão a perceber as armas , & artelharia, fazer cartu- xos, ôc outros atavios de guerra para qualquer iuceflb delia. Peta nova que havia na índia dj ferem paíladas a Sunda muytas Náos Olandezas : com quereccavão encontrarem-íc. E com eíle rece- yo, 6c fe verem deíla banda do cabo com tanta brevidade, 6c prof- peridade, defejáraô todos feguircm fua viagem ao Rcynofcm^ tocarem a Ilha de Santa Elena , nem outra alguma por. tereiii faude j 6c mantimentos , 6c agua para o poderem efcufai* , 8c en- tenderem que podiaõfer em Lisboa atè Mayo o mais tardar. E propondo-fe ifto ao Capitão mòr António de Mello cora algíías razões que davaõ para o perfuadircm a iílo , cllc lhes rcfpondeo: Senhores bem conveniente fora para nos feguirmo,s noíla vingena ao Reyno ícm ferrarmos a Ilha de S,anta Elcn.i > 6c aílim o cnten- • do, 6c entendi em Goa , fobre que úz muytas inílancias ao Vifo- ;Rey Ayres de Saldanha , 6c aos do Confelho daquellc Eíladc,pa- .ra me naõ, obrigarem ir a Santa Elena , & uaõ foy poíTivel outra Goufa,,ppr íer precif^ ord.cm de.S. Miigeiailc,ioiiiarp.Oito .u:lla, 'Az & ^;4 Iratadodofucefjo &erperar atèltodo Mayo pelos dous Gaíeões de minha compa- nhia , para dahi todos três innos a bufcar á colb de Portugal , on- de ha coíFarios. Com outras ordés que me deraó em bú regimen- to aflinado pelo Vifo-Rey, que cu naó poíTo em que queyradcy- xar de guardar pontualmente. O qual regimento entre outras muytas coufas que não fervem para eílc lugar , continha em fum- ma o feguinic. Que a derrota foíTe á Ilha de Santa Elcn% como S. Mageííade mandava, levando o Galeaó a ponto de guerra, 8c que achando algum navio furto ocometeíle,felhe pareccfle queft- guramente o podia fazer, de modo quenaò deígínaílc ofurgi- douro.E q chegado á llhafurgillc na primeyra ponta delia a que chamaó o efparavèl : Porque citando a bahia tomada de Náos de inimigos ficava feguro de poderem ir a elle , por ílmpre o tempo fer por cima da terra , contrario a quem eftivefíe dentro , quenaõ podia tornar á dita ponta. E naó eííando Náos de inimigos na ba- hia, também ficava mdhor no dito porto, para delle defendera entrada da Ilha , a quem a vieíle demandar de fora. E que depois da Náo bem amarrada,feria bom mandar em terra fozer hu i eílari- cia com du iS, ou três peças de artilharia , bombardeyros, &: gente, a cuja fonbra ficaria a Náo melhor defendida , & para oífjnder a quem vieíle demandar o porto. E que acontecendo ajuntarem- fe todas as Náos da companhia , parecia que naõ diviaô de deyxar o dito porto do efparavèl ainda que a aguada f^ fizefte cnn mais trabalho, pois que dtlle fe podiaó defender, 6c ioípcdir aos inimi- gos que naó furgiílem na llha.E que acontecendo,que no dito lu- gar, & na bahia , eftiveílem furtos navios com que náo folie licito arrifcarfe a pelejar com elles,paftaíl'- dclargo lèguindo fua via- gem para o Reyno, na forma do regimento. E que fa i-gindo erii terra, em Santa Eleni mandaile vigiar n terra, 6c Ermida por pef- ibas inteligentes, & que foíicm ao alto da fcn*a defcubrir raílo de inimigos, ôcc E que acontecendo qiíe apparec- flcm mais Náos^, que as de fuacompanhia , ( qucera indicio c.rto de ferem inimi- gos ) felizcfle á vela na fÓ4 m/i , que aflcntaíle com os officiaes, fi- dalgos, & mais piílbas que con vieíle pura mais fegurança da via- gem : Naó fe defviando da altura limitada. E que fe encontraíle com algus navios d- inimigos deyxava em feu entendimento, o conjôlcavèri* co.» elks. Com o qual regimento fe conformou, & Dô Galeão Santiago. c| & quietou o Capitão mòr ,ôc dcfendco do que fe Jhcpropoz» Re- ;fclvendo-feque naõ podia deyxardeoobfcrvar ,ôc tomar adita Ilha, por mais inconvenientes que diflb fe reccaílem. (Que no que Sua Mageftadc ordenar em feus regimentos , naõ cem alguém ar- bitrio.) E foy forçado conformarem-le todos com elles,& gover- narem a Ilha de Santa Elena. Levando ordenadas as armas, ÔC Gs ânimos para todo o fuccffo. Apreílando artilharia, & xarctan- 4o-fe, 6c todos os mais petrechos neceíTarios , & convenientes á guerra. E o Capitão mòr nomeou para o cuydado , & defeníà de algús lugares do Galeaó ás peflpas que lhe parecerão fuíBcientcs para couíâde tanta importância, como foy Dom Pêro Manoel parao convés , Ruy Pereyra para a proa , & Simaô Ferreyra do Valle pa^a a tolda. Com o qual concerto os deyxaremos ir cami- nhando , por tr&tavmos do inconveniente , & adverfario que já os eftá efperando na dita Ilha. CAPITVLOSEGVNDO: J)e e^nem crao os inimigos , íjue na Ilha de Santa Elena encontrou o Galeão Santiago :& do propojito com que neltaejtavao, NAquelle mefmo anno de i6oi.emquc ElRey no íTo Se- nhor mandou foccorrer a índia com Armada dos Galeões ( como eftá dito) fahirão do rebelde Eftado de Olanda três cfquaw dras de Náos para a cofta da Sunda , de húa das quaes hia por Ge- neral Cornclius Sebaílianus Olsiidez. E fahio da Cidnde de Me^ dio Aíburgo , por ordem de Maurício ,êc do Coníelho daquelle Eftado, a aíftntar amizade, & pacifico commercio com EJRey da Sunda. E que voltaria cedo com algua piment?',^ o mais boyan- tes que podcfllra , trabalharião de íe achar naliha de Santa Ele- na, ate meado Fevereyro o mais tardar, onde efperar ia algua Náo nQÍla de carreyra da Indi^ , & trabalharia. pek tomar rendcndo-a as bombardadas , & naõbahoando nunca comei la. Com cftedi- cinio ,-& regimento fez volta Cornelius da Sunda taõccdoquç antes de quinze de Fevereyro cftava já na Ilha de Santa Elena* furto com tresNáof, trazendo ccmfígo dous Embayxadoresdel- Rey da Sunda aviíitar Maurício ,& a feu negocio. Eraó as três Náos todas 4c hum porte ,. a Capitania àa& quacs tinha trinta 6c - A 5 ' duas ^ Tratado àafuceffo •du-as peças de artilharia de bronze , & cada hiiiiia dàs outras triíita peças, em que havia canhões de Icllcnta quintacs,qiie atiravão pe- louros de vinte, & de vinte 6í quatro livras dcferro coado ,crík) Navios d^ guerra feytos para ido ,6ca primeyra andaina de aitir Iharia groça jugavão por bayxo da ponte ao lume d'agaa por ef- tarem boyantes, & não trazer cada hua tnais que dous mil quintaes de pi menta. Tinha cada Náo perto decem hoiicSjquefaziiõoííi- ciode foldados/marinhcyros ,6c bombardeyros, conxo he cpíltí- inedaquclía nação, com que Èizem granJe vcntagcm aosnoflbs Navios. Eraõ todos hereges Galviniílas, ÔC pela mayor parte, feiji • Ic enxergar entre tiles mais que fó hum Catholico. Eííiirãa pro- vidos de rnuytas invenções da armas , & plilicias de gucna , & de • taógraõ cópia de munições de refpeyto , que depois de trcsdiis ide batalha com o noílp Galeão contarão na fua C ipitania os. pe- louros que lhe fobejáraó de bombarda, &: achánó íeis-ccntos , 2c tantos ró de cadca, 6c de picão , de ferro coado, a fora os redondos: Segunda o(^^parecènãoCfaiia6)oúttò láftróféna^ó pelouros. A fuá fifaça de armas , 6c convés de artilharia, era taõ djfembaraÇl- dOjÔC as portinholis também rafgadas , os reparos das peças tam- bém obradas,, 6c tudo com tanta conta , 6c razão , que borneavão .artilharia para a popa , 6c proa com muyta facilidade , apontando ;tanto aokime d'agoa , que tendo húa deftas Náos depois da bata- .Iha hum batel a bordo, o pefcavão com a peça de meyo, a meyo,$C tudo mollráraô , de induftriâ por moftrarem aos noílbs ocomo andavão apercebidos. Eo noíTo Galeaõ Santiago que em popa vem caminhando a encontrarfe com eftes inimigos não traz mais que dezafete peças de artilharia, cm que çntraó quatro berços ,6c dous facres, ôca mayor peça he hCia meya efpèra. E tudo fobre a ponte,onde mal fc pòie bornear, nem jugar cora muyto empacho de cayxaria , 6c fardos , & as portinholas eftreytas , que ficavap de peyor condição com a_ groffura dos dous coftados. E naó trajyia mais que trinta pelouros de picaó,6c cad:a. Apontey iílo para que fe veja com quanta ventagem eftes Olandezes fe encontrarão com eíle Galeão. E o recato , 6c aparelho com que convém aos noíll)s,6c Náos da índia, andar, pois fe pode eíperar c ncontrare ru- fe o Jtras vezes CO n cll es , 6c fiybáo: a grande ventagem com que QS bulcão. Acháráp cftes inimigos na.Ej*inida de Sa»ta JL.lqiaa, a . . ; , . ' carta. DoGaleaoStintiâgo. ji carta , que poucos dias havia deyxára nella a mal afortunada Náo Saó Valentim, que vindo de arribada de Moçambique , foy toma- da de Ingkzes ancorada cm Cezimbra , no mcfmoanno. E faben- do pela carta , que a Náo era paliada por Santa Elena , receberão grande defprazer fegundo depois contavão magoados de Iheefca* paraquella preza. E fizcrão com grande prcftezafua aguada »le* nha,&omaisque da Ilha podiaó efperar , para eílartm tanto a ponto , que Icm dilação fe podeflem fazcr à vtla a acometer qual* quer Náo , que ft lhe offerecefle antes de botar ferro , nem fe lhe poder acoitar aterra. Traziaô comíígo artificcs de pintura , & ef*. culturáípara debuxar, Sc eílampar os portos , terras , 6c tragcs das gentes onde portafiem , & hum deftesdeyxáraõ em Sf.nta Ekna, Irgundo fe colige do que digo no Capitulo em que trato dcíla I^ lha em particular. CAPirVLOTERCEYRO: Da chegada do Galeão Santiago a Ilha de Santa Elena , & da batéis- lha que nella teve com os Olandez^ej* f^ Orno os que fe vem em grande profperidade devem com ra- \^ záo andar cercados de reccyos da adveríidade vinha o noíTo Gíileão Santiago correndo em popa com tanta brevidade, & prof- pêro tempo, que nunca outro paíTára o cabo de boa Efpcranç^jde maneyra,que em qmtorze de Março, amanhecendo em huma quinta fi yra , houve viíla da Ilha de Santa Elena , para todas as Náos da Índia taô deleytofa , Sc paraeíle Galeão tão forçada , 6c poueo alegre , quantos crão os defcjos que todos nclle traziaõ de a não ver ncíla viagem. E aílim como gente cercada mais de juílos reccyo5j que de gofto de ver terra.fe cfquccèrão do alvoroço com que todos a vinhão ferrar nos annos atras. E aos que melhor fen- tiaõ do negocio não Iht s f arecin terra , fenão prodigio de fun àtÇ-' .nventura. Com tudo Bzendo bom roílo á fortuna ( a que a gcnté da Índia , 6c da carreyra delia já anda coílumada) , apix ílou cada hum as armas , 6c aparelhos de guerr?, que lhe tocavão : Outros trabalhando de botar o batel fora , outros çafando amarras , 6c an- coras, foraõ bufcar a tcrru pela parte do Norte, 6c chegarão a deí^ cubrir a ponta do cfparavèl que demora aQ Noroeíle, & vii'ido na volta t Tratado do fiiceffo volta dcllc ( viraõ que no porto de Santa Eiena , ) Sc algús dizem que na aguada velha, eftaváo an :oradas as três Náos que caufáraô a todos a torvação já tanto atraz ante viíla , tendo por fcm duvi- da ferem inimigos. Hus diziaó que volcaflcmparao mar,& que mo tomaílem oefparavèl, outros tinhão outras opiniões. A todos fatisfez o Capitão mòr, & os aquietou dizendo , que o Galeão era navio muyto pezado, ôc vinha carregado no fundo do mar, 6c não podia fu^ir áquellas Nàos, que eíbvâo boyantes , 6c o tinhão vif- to não fo do porto donde cila vão, mas defde que amanhecera com vigiasqucdiviaóter nos cumes dos montes. É que fazer voJca er* acrefccntaranimo ao inimigo , cuydando que lhe fugiaó : Mór- incnte quando elle pela ligcyreza das luas Náos os havi^. logo de alcançar. Que fc encomcndaílcm a Dt:os , & ouvcflc bom animo, & fe foíle lançar ferro onde o regimento mandava. O mimigo quando vio o Galeão ir na volta do efparavèl, pareceo-lhc que por lhe eftoi'Víir a preza fe daria alli fUndo , ou fogo acolhendo- fe a gcnté a terra* ( Como já tinhaó feyto os da Náo Santa Cruz na Ilha das Flores acoffada dos Inglezes ; defpedio com prcftcza hua lanchi ao Galeão, com hum trombeta, ôc elle levando as amarras íefoy fazendo avela com a fua Almiranta deyxando aterceyra Náo pacifica no porto, ou foíle ( como eiles depois diíTeráo ) que «erão de outra efquadra , 6c não traziáo ordem de pelejar com as nodus Náos, ou para cftar de íobrcccllentc, & náo deyxar naqucl- le cfpaço em que ellc hia na volta do mar ( ate ferrar o efparavèlV defcmbarcar no porto a gente do noflb Galeão no feu batel: FoíTc como quizeíle a fua lancha chegou perto do Galeão , no qual en- tendendo-fe que o vinha reconhecer, ôc a gente,& artilharia , lhe bradarão da popa que fallaíle de longe. E affim o fez perguntan- do que Náo era aquelh,ôc juntamente do Galeão lhe pergunta- rão que Náos eráo as fuás, refpondèrão, que de Olanda^ & que vi- nhão do Dáchem, & ifto fc entendia mal, porque era de longe,po- fto que algús dizem , que fizerão comprimentos da parte do leu Capitão mòr, outros dizem que chamarão ao noílb Capitão mòr» que foíle laque o chamava o feu General. E não duvido dos cum- primentos fingidos j porque era fua tenção entreter o Gíileaó , & jêgurallo que Cl ão amigos, pelo temor que tinhão quefizelle de fi. E que foílcm os. comprimentos fingidos bem fe vio na preltcza, com DdGâhao Santiago. 9 coniqiiefcderam-arrouv&veyo Forçando osmaftos pbr ferrar õ .cfparavèl, levantando- ledo porto pacifico cmqueeíhva, hunía igrande meya lcga3;6c pretendendo-fc melhorar no furgidourOjCÕ :bandcyi'as, 6c galhardetes largos , tocando trombetaá,com todala í artilharia abocada , 6c a gente euberta, que faô íinaes claros de ba- talha , & de inimigos. E naõ he concluente a razaõ o que algUQs querem dar , que le levantarão as duas Náos por temerem que o Galeão os folTe balroar,porque iCo eftava na fua mão delles quaii- do iílb fora, ou o Galeão paíiàra o efparavèl , em que havia tempo de le levantarem , & baftára ir na voltado mar pela ligeyreza das luas Náos ;& maiseíle inconveniente ficava na fua Náo furta, ^ que íe naõ bulio do porto. Mas a fua tenção era batalha , 6c iílb eí^ ptravão alli. E não era o Galeão befti ancorado, quando elles fur- girão com eiJe mclhorando-fe no furgidouro de tal maneyra, que o Meílrc do Galeão Simcaó Peres bradou pelo Capitão mòr , que mandaílc atirar áquella Náo, que não convinha confentilla anco- rar naquelle lugar. O Capitão mòr , como a batalha já eftava def- cuberta, entendendo que o inimigo o naó vinha bufcar alli com tanta prefte7a , 6c em tal forma para paz , f não para guerra , lhe mandou atirar húa peça,que não era bem diff arada, quando o ini- migo que vinha a ponto, com bota fogos accfos em lançando fer- ro, 6c juntamente difparando no Galeão fua artilharií^^não perdeo ponto, afiim de húa Náo, como da outra , de tal maneyra, que fe travou húa muy cruel batalha de parte a parte, eílando a tiro de arcabus , 6c de moíquete , de que os noílbs uf irão todo o dia , mas com pouco eíTeyto por não apparecer dos inimigos peílba alguma defcuberta a que fizeílem pontaria. O noílb Capitão mòr vendo que na forma em que eftava , muy ta da fua artilharia não pefcaví? as Náos dos inimigos mandou dar hum cabo cm terra pela popa do Galeão , pelo qual alando- íe,o atraveílbu de maneyra, que ft n« tindo o inimigo o dano que recebia da noífa artilharin,fc fez à vcl-' la na volta do mar, 6c tornou a furgir de maneyra , que fe defvioii da pontaria da artilharia , recebendo menor dano , 6c ficando hua -delias pela proa. E pelejando com cfta ventagem todo o dia desfa- zendo , 6c defaparelhando o Galeão , ouve de parte , a parte mu)^ tos mortos, 6c feridos, entre os quaes hum foy Francifco de Mel- Io de Gallro^quç tendo pelejado do convés j §c da xarjeta com feu- .• B mcn- IO 'Tratado do fucelfo arcabus, Sc vendo, que era de pouco cfFey to, andava no convés^ ajudando a pelejar coip artilharia, quando dando hum pelouro cm hum bombardeyro ,& efpedaçando-o , os outros defamparáráo a peça que clkeftavaborneando. E acudindo a ella Franeifcodc Mello , animando aos quefe arredarão,, deu outro pelouro pelo próprio lugar, & rompendo o coftado , lançou tantas rachas que o ferirão cruel, 6c morcfilmehte de treze feridas abertas,6c lhe que- brarão o olho direy to que logo perdeo: & cílando no chaó amor- tecido ^ Dom Pêro Manoel que naõ eílava longe delle,.© qu€ qui« 2era encubrir de feu.pay. E nao o pode fazer , porque como elie a todo o fuceíTo acudia logo , viofçu filho no chaó , ôc cuydando eílar mort» levantou avós.. Ediíle„fenhoresna6 haja turbação» iè meu filho eftà morto cubramno ,.que acabou em feu officio , ÔC cada hum.acudaa ícu negocio. Nam ceflavaó osnoílbs de bufcar todos os meyos , de ofíender os inimigos uíando de mu y tos car- tuxos que ti*aziaó fey tos , Sc naquelle dia gaífcáraõ cento , & tantos deli. s efperando t:\mbem a terrivcl trovoada de muy tos, 6c refor- çados p. louros do inimigo que de continuo- difparavaó fcm celTar momento , fazendo eílrago grandiflimo no Galeaó , ôc fua enxár- cia pafiando por onde lhe acliavaó vão ,. de tal maneyra que hiaó> >parar na rocha com tanta fúria , como fe nada tivcraó pafladc. E paliando hum,dcíies pelouros peloconvès em queeftava Duarte Bavbofa com a cfpingarda na maó lhe deu nclla , 6c kvou àm.etade cm claro, deyxando-lhe a outra metade nas mãos , naó perdendo cllc neíle paço oaGordo,.quc para tal tempo convinha ter promp- to , & como quem nâo^era aq^ella- a primeyra emquc fe achou. Outro pelouix) fez huma çoufa no convés do Gdleaò ^digna. de íç fabír,. porque paílbu^ o coftado ,6c juntamente bum ítirdo gran- ' de de caniquins de meyo , a meyo , & foy dar na habita comtan» tH fúria que deyxando ncilá huma grande moça concova , t^ornou^ atraz , & dando em outro fardo junto ao fogáo íiilíou , & foy dar na cabeça de Jpáo Carvalho marinhe yro , 6c oatordoou , mas nao lhe fèz.nada , porque hia já fraco.. Por onde nam parece qa€ ha. muyto que fiar. de fardes de caniquins para ft gurar de femelhan- tes- pelouros , como alguns tem que baftaó. Acabava hum bom- bardeyro eílrangeyio chamado me íli e António ( por \hç. naõ cor- rer hua peça a fcu goilo ) de dizer, pligue a Dios que vcnga una^ bala, Do Gate ao Santiago^ 1 1 tói .y me quiebre efibás piernas , quando liiocrao ditas as pala- vras, cliegoU a bíílàvêcl^as quebrou v^C o matou. O piloto tinha feÍ5 eícravoâ , êc parecendo^! he que eílando erpalhados pelo Ga^ leaó não cítavaõ tnuyto feguros , ajuntou-os , & meteos na habit* râuytoj ancinhos , veyo hum pelouro começando no primeyroi, acabou no derradeyroi efpedaçando-lhos todos féis de hum gpU. pe a hum foldado da Índia criado de Rey que vinha a certo re- xjuerimenro , deu hum pelõiaro, àc Iheljvoa meya cabeça fora, 4c fem' mais fali ir palavra. Fjíl*ticularizey cftas mortes pelo diffj- rente fuccílb delias. Além das qiiacs ouve outros mortos , ofe- ndes. E os inimigos naó eftavao fem dano , & mortes , porque fé de hum tiro doGaleaô morrerão três juntos. E heíVa forma , ti- les pila preza, 6c os noíTos por fua defenf » , a batalha fe continuou das oyto horas da manhãa ate que a n3yte,que á fombra daquellas altas rochas lhes ficava mais oblcura , os obrigou a fiicncio. Naõ faço particular menção dos fidalgos , &í foldados que nefte dia fe aílinilaraõ , porque como nam vicraõ às mãos , naõ ouve lugar de couías particulares, baile que todos em geral raoílraraó grande valor com fobeja conftancia, & oufadia , pelejando com feus mof- quetes , & arcabuzes , & ajudando a todo o menjyo da artelharia, naô perdendo ponto de tudo o que em tal batalha , ^ eftado lhe era poílivcl ,cheyos de magoa de naõ poderem chegar com os ini- migos aoscabellos. Epoílo , que mais naõ fizeraõ que porem feus peytos , fem mais outra defcnfa , à fúria de tanta , 6c taó con* tinua , & reforçada artelharia , moílraraó bem feu valor , & apro- va de quem eráo : Pois que podendo-fe efcufar de tão provável perigo, lançando-fc à terra a que eílavão pegados, pode mais com clies a obrigação de cavallaria ^ que o temor da morte que viram prcfcntc , mais cheyos de pezar , éc cólera pelo mào aparelho que cinhâo para offendcr aos inimigos , que criítes pelo dano que re« cebiaõ delles. Cerrada pois a noyte fe deu fundo aos mortos , & fccurárão 03 feridos com todo o amor , 6c charidade poíTivel , re- formou-fe a enxárcia que cila va defpcdaçada > trabalhando todos niflb , ôc em outras coufas neccflarias a fua defenfa : Atè que ren- dido o quarto da prima , parecendo ao Capitam Mòr que os ini- migos Ihetinhão naquellc íitiomuyta vantagem com tanta, &: tão reforçada artilharia , que não fomente jugavaõ por cima da . ' " ■ Ba ponte. 1.2^ Ivútúclo dofucejjo ponte, mas por bayxo ao lamc d'agor', que poílivel era que no lar-^ go do mar picado não ufariaó, êc lhe feria neccilario fechar as por- tinholas mais importantes , 6c que alli poi' as fuás Nãos ferem taõ vtleyras que cada vez que quizeífcm íe podiaõ melhorar de fitio,' mais acomodado à ofFcnfa do Galeaõ , do qual os naõ podiaõ of- fender >eftando ancorado ao pè quedo recebendo baterias , & que de outra maneyra feria andando à vella. ( Acrcfcendo a ifto huma razaó particular que me pareceo não declarar j (Deyxando lugar aos curió fos de a poderem inquirir ) que muyto o obrigava fazer- íc à vella , 6c feguir feu cammho , 6c pelejar no mar , em que fe ^udaria melhor da fua artelharia de huma , 6c outra parte que af- íim furto- lhe mal fervia. Deu conta diílo a algumas peílbas , que paraaquellc particular lhe pareceo noeftado em que o negocio cílava , 6c que em/eguir feu caminho ;fc conformava com feu re- / ^ gimento que aíTim lho ol^enaVa ^fe naquella bahia achalle inimi- gos , com quem lhe naó pâreceíle pelejar. E a efta opinião do Ca- pitão mòr ajudou tambern. o Meftre Simaó Peres , dizendo íer acertada , que ainda que os inimigos os feguiflèm atè o Braíil , íe os nó meteílem no. fundo ( que era ío o que fe podia recear ) hia pouco em osdefaparelharem vinte vezes , porque tantas fe atrevia a reformar a enxárcia. Finalmente rendido o quarto da prima , fe defamarrou o Galeaõ. E porque o inimigo comofoy noyte fe tornou logo ao porto donde pclamanháa fe dcfamarràra , naó fe havendo por feguro do Galeaõ íeu veí]nho,o poder denoyte a l)ordar de algum modo , que era o de que o inimigo muyto lugia, 6c fe t mia ,.& temeo fempre, 6c o que os noílbs muyto delljavaó: 6c ao tempo que largarão à noarra foraõ ficando fobrc a poiata do çfperavèl virando fobre o porto, largarão vella , 6c picando a eí^ pia que cftava na rocha , puztraó a proa nas nàos do inimigo , que vendo vir o Galeaõ feaiàraô tanto para terra , 6c com tanta prcf« teza , que íicaráo por balravento , 6c os naõ poderão abordar : com aílaz magoa dos noflbs. A que naòfoy poíTivel outra coufa, fcnaô fcguir fua viagem , que cfcolko por meyo mais acertado^ : €AP. Do Çakao Smtiago. |^ CA PI T V L O g^V AR T O: pa acção com qnea nAvegaçAo âe Guine ^ Brafil , é" de OrieKte pérten^^ mais k Cor o A de Pcnugal que. a outra alguma. E quando tevepriíu '.^^ cipio, E da tjrannia dos OIandez.es. E eme Ilha he Santa Ekna , quando , &fQr quemfoj defeuhrta. M quanto vay o noíTo Galeaó caminhando , & oã inimigos a poz clle , paremos hum pouco ncíle hi'i\ gar, vejamos , com que acçaó pertence à conquifta^ éc navegação de Guiné , & Brafil , & índias Orien- taes , mais á Coroa de Portugal que a outra algúa.' E quando, 6c por quem teve principio. E que 11 hs^ hc efta de Santa Elena , quando , 6c por quem foy defcuberta. Hq coufa digna de confideraçaó ver os milhares de annos que a Divj^ na Magt ílade teve occulta , efta navegação havendo taõ curiofos, & grandes Mathematicos , 6c Cofmographps. E como a referveu Deos , para a naçaó Portugueza : que para ifto foy criando de taó pequenos principios , naquelle bemaventurado Século ,,de mil,£ç duzentos em que levantou o Magno Dom Affonfo Henriques Primeyro Rcy da familia,& povo Portuguez , verdugo forciíH- mo dos Mafomiftas , ao qual noílb Redeptor JESU CHRISTO appareceo no campo de Ourique eftando para dar aquella memo- rada hatalha,a cinco Reys Mouros que com todos feus poderes, & com milhares de Mouros , o tinhaó cercado , tendo elle muy pou- ca gente Portugueza , & acovardada da multidão dos inimigos. E entre os mais colóquios que com elle teve nollb Senhor JESU CHRISTO, foy darlhe eípeólativa da navegação ,& conquifta que hora pofiue efta Coroa neftas palavras , que entre outras lhe difíe: Appareçote Affonfo ilfi para fortalecer teu coração nejfa batalha. E para fundar os principios de/ie Rejnofobre hua pedra firme : Confia que nao' fió nejla alcançaras vitoria, mas em todas a^ que pelejares contra os inimigos da Cruz^. Efe efteteu povo te pedir que entres nella com titulo de Rey corp- cedelho : & nao duvides,. Porqpte eu fou o que dou , & tiro os Impérios^ & ReynoS; E em ti , & em teus decen dentes quero fundar Império : Para que meu nome feja levado agentes ejlr^ngcyras . E para que temfuceffores- fají^ao o fkndadçj defiç Rejnofaras huas armai dopre^o com que eu cor^ ^ ■" * '"" ' ' B 3 ~ ' " pref i4 Tratado dofuceff'^ frej ogenerchumAno, & d^ com que fuy compraãopelo^fkâetU. Efermeha tfte Rcyno fantificadâ ^pnrona Fe ^ & amado âé mim com pied.idf , Em^ dcllt\ nem de tife apartara em algum tempo minha mijersc^rdta. P&rque lhe tenho Aparelhado grande feara. Eos efcolhipara meia et>verarks para terras remotas, ^c. . . - Como tudo iílo que aqui fummariamente abrevicy-, com ou- fías coufas eonftado auto, que o próprio Rey Dom Affbnfo , fct cfcrever^ôc aíSnou, nas Cortes, que celebrou na Cidade de Coim- bra, em trinta de Outubro de 1 15^, cm que a^rmou com jura- mento, que todo o fob redito lhe diíllra noíTo Senhor J ESU CHR.ISTO , no dito campo de Ourique , 6c q^aem mais por ex- ^ tenfo , quizer o dito auto a .hilobt , na Chroiiica de Ciller , 6c na cJi^ Genealogia dos Reys deftc Reyno.Que èu naõ toquey aqui mais, por brevidade, que o tocantea meu propofito.E ainda que naó ef- tivera jurado, por hum Principc .taõ Catholico , 6c Santo , Sc fc vc tudo comprido aos Portuguczes obreyros dcol Lidos pelo Senhor para terras remotas. Para o que lhes refervou efta navegação, 8c conquifta do Oriente,Guinè , Ethiopia,^ Brafil, 8c Ilhas adja* centes: tendo-a para iflb oculta a toda a outra naçaó f^yi. annos, que havia, que criara o Mundo , 8c 57 1 7. que fora o dilusâo uni- Verfal, ate o qual tempo naó havia na Europa naticia de mais que ílas Ilhas das Canárias , & mar Atlântico , onde fenaõ hia fenaô no vcraõ, & em Náos grandes. E charaavaó-fe Ilhas afortunadas , pe- io muyto que haviaó que fazia quem hia , 8c vinha a cilas. Porque referva va Deos efte bem para eíte povo I?ortuguci^ , como refer- vou , indo-o para iíTo criando neftas ribeyras do mar Occeano de taó pequenos princípios: Ampliando , 6c favorccendo-o de modo que lançarão defte Reyno : & ajudarão a lançar de Efpanha os pérfidos Mefomiftas , atè paíTarem a poz ellcs a Africa , onde lhe tomáraó muytas Cidades , alguas dasquies ihc lárgáraô depois, por feguirena a cmpreia da navegaçaójôc conquifta, para queeraè criados. Atè que foy fervido quefahiíTem os Portuguezcs Teus o- breyros, com os femcnteyros dcfua fanta palavra Evangélica , & fbílein deauiíciar feu fantiffimo nome, pela redondeza d i terra, 5c aos mais remotos limites delia. Infpirando no fercniílimo Infante Dom Henrique Meílre da fua Ordem , 6c cavallafia filho do vale- toío Rey Dom João o PrimeyrO' , decci;dêcc dò Sa^nto R<:y l>om . , ■ w ■• AíFoa- Do Galeão Santiago. if 4ffi>nlb Henriques , que começâíTe a dar principio ,& abrira po^ culta eílrada do Occeano , atè o Oriente,á: dilatados Impérios, íç Reynos delle. Infpiraçaõ divina ( & digna de tal varão. ) Princi» pio das promeffas do campo de Ourique. Porque abrazado o Sç-» reniífimo Infante era hum fentapropoíico da propagação de noílâ SantaFc Catholica, aviou huma embarcação conveniente , em que os primeyros que inviou,. nam oufando a engoifarfe no mar fc tornarão fem- fazer nada pafmados de tão largo golfaó , & navegação tao occulta. Segundou o Infante por outros defculjri- dores ,que chegarão , até ferra Lioa ,8c Ilhas de Cabo Verde, diC- tancia das Canárias de 244. legoas^no anno de noíTa Redempçap de 14x0. 6c do diluvio 57x7. que à hoje 184. annos, 8c havia 288. que CHRISTO noflo Senhor apparecèra no campo de Ourique a ElRey Dom AíFonfo Henriques,, 8ç jà havia dezsnnos que c Infante tinha inviado os primeyros navegantes. E alllm ha 19^ que os Pbrtuguezes fe começarão a engoifar noi Oçceano- E no annode I4??. treze annos depois dedefcuberto O' Cabo Verde, lançarão mão defta e tn preza , Joaõ Gonçalves » 6c Triílião Vaz,. que fe houvèrão-ne.lla , com tanto valor , que rompendo por todas as diíficuldsdes , & temor ( que naquelle tempo occupava a todp ©animo ncíle negocio ) 6cc0m razão ,.dcfcubriiãQ toda acoíla de Guiné .,&■ dia Ethiopia, ô£ horaatropeladosdomar,horados ventos , chegarão atè o mar da índia , Guja nova foy tão fcftejad?,. & tão grata à Santa Igrtj^. Romana ,. que oSanto Summo Pontir íice Martinho Quinto no anno de 1441 deu fuaapoílolica béção,, & faculdade ,ao fereniííimo Infante por tão iníignc obra , incoro porando à Coroa 4^ Portugal, tudo o que íè defcubrilfe das Ca- nárias atèoukima da índia,; A qual graça depois coníirmàrão= ampliílimanicnçe os Santos Summos Pòndiices Romanos, È' tendo o Infante gaftado neíla empreza cincoenta annos o lévoa Dcosaigoznr do premio de fuás virtude», 8c ElRey Dom Afíòn- £ç> feu fobrinho continuou:depois eília conquilta em quãta vivepj, & muyto mais l IRey Dom. João o Segundo ,, que niíTometep muyto Gabedalcm eujp tempo defcubrio Chriftovão Coíon arena do novo miuido^achado antes pelo grnnde Américo Vefpufío ,.do' qual tomouio nome que tem de Aíhcj ica. Sobre o qual novo â^í- çubrin^iento y ouve as duyidas entre Portuga,! ,. 8(. "CaftdlaV quç: t'. . , ' çonclui. ^tS ^ ■ Tratado do Jucejfo ^ fconcluhío òPapa Alexandre Efpanliolcom aIínhaqucknçoU'ae Pollõ, a Pollo qqatroccnta?, 6c fctenta kgoas a Loeíle das Ilhas de Gabo Veí-dc ; a[i>plicando à Coroa de Caílella tudo o^ a linha de- marcava à parte Occidentíiljôc à Corqa de Portugal ò quç demari- 'cava ao Oriente , da qual demarcaçãp lhe coube a terra do BraliK 'AElRey Dom João o Segundo focedeo ElRey Dom Manoel cm cujo tempo eíla navegação , 5c conquifta teve kliciílimos fuc?- ceflbs. E foy achada , 8c deícuberta a terra do Brafil por o Capitão mor Pedro Al veres Cabral indo para a índia com doze navios de armada , no anno de i5'oo. a três deMayo dia daSantilíimn Ver?i Cruz , que na colla daqucliagraõ Provmcia Foy alvorada , & poí- to o feu fanto nome, que depois fe mudou ao que tom por relpe)^ to do pào Brafil de tinta que nella foy achado. Eftã eíla terra do Brafil, dous gràos da Equinocial , ôc corre fua cofta para o Pollo ^Auftral , quarenta , 6c cinco gràos em que ha 1050. k goas de cof- ta de mar : a fora o Sertaô , que tem quinhentas , &: dez k goas no ^mais largo. He efta Província triangular, v^è pelo Sei tão os altos •montes do Peru , diíla fua cofta do cabo da boa Efperança mil , & duzentas Icgoas de mar: todaheteiTa fádia, 3c cxcellente. Do que fica dito , proccdeo a acção com que a naçaó Portugucza cem a dita navegação, 6c conquifta, 8c os títulos que a Coroa deftc Reyno tem de fenhorio de Guiné, 6c da conquifta navegação, 'icomcrcio daEthíopia, Arábia, Perfia, 8c da índia , adquiridos eom grande defpcza de Armadas , 8c pelas armas, 8c muyto derra- imamento de fangue Portugucz,8c principalmente favorecidos por noílb Senbor JESU CHRISTO, 8c efcolhidos para ifto poi^ íua Divina Mageftade, para obreyros da fcàra de feu Santo Evan- gelho, poretles levado, 8c pregado pek redondeza da terra, 8c mais remotos limites delia , onde he conhecido , 8c reverencia- do o Santiffimo nome de JESU. No que fe vè cumprido , o glo- riofo Colóquio do campo de Ourique , clara , 8c indubitável ver- dade do que o dito fenhor ReyDom AíFonfo Henriques juroa nas Cortes de Coimbra. E aíTim fe os Hereges , t;^ piratas , pcr- guntârem* ( como elles pcrguntaó ) quem deu efta conquifta mais aos Portuguezes que a outra nacaõ , fclhe refponda que noífo R-demptor JESU CHRISTO,"8( a fua Santa Madre igreja Ro- mana Efpofa fua Sagrada j 8c que os Portuguezes icra-íêus titul^©s ' '' ' em Do Gaíeaõ Santiago. 17 cm pedra firme da palavra de JESU CHRÍSTO noílb Dcos,quc naó pôde faltar. E íè querem mais prova defta verdade , vejaõ ò triunfo da Santa Igreja em todo o Oriente , com tanto fruto, & gloria de noflo Redemptor , como là tem feyto o Sagrado Evail-; gelho femeado pcloí filhos dos glorio fos Saõ Francifco , Saô Do-' mingos , Santo Agoílinho , & outros Religiofos que paílaraó à- quellas terras remotas , onde muytos derramár;,6 o fangue , rece-' bendo coroa de rnartyrio , 6c gloria pela Santa Fè CathoIica.Tem •também triunfado miiyto a Santa Igreja no Oriente depois quca elle paíliiraõ os Padres da Companhia de J E S U , verdadeyros obreyros delia Sagrada. feára, 6c Apoílolos de fcu Santo nome, & Evangelho , que com fua Santa Doutrina tem feyto pafmar os infernos com a grande converfaó de infinitos milhares de almas que com fua pregação reconhecem pelo mundo o Santiílimo no- me de J E S U , ÒC recebem pela fua maó o Santo Baptifmo,na5 fó no Oriente ate o Japaó , 6c acè a China , mas na Ethiopia , em a grande Provincia do Braíil entre o mais bárbaro gentio do mun-' do, pôde tanto a doutrina da Companhia de JESU, que naõ fó vam reduzindo aquclk bruta gentilidade à Santa FéCatholica, jnas àpulicia humana que entre elles naóhavia.Demaneyrn,que parece que eftà bem provado , contra as perguntas que fazem os Piratas a acçaõ comquí os Portuguezcstemeftafantaconquif-' ta. E pelo confeguinte fe prova contra os Olandezcs rebeldes, contra feu Rey , ôc fenhor , ôc contra a obediência da Santa Igreja Romana , a pouca , 6c ncnhúa que elles cem , para irem ao Orien-| te , nem para tomarem os portos dcfcubertos pelos Portuguezes,' & rauyto menos para lhe tomarem fuás Nàos , nem para debuxa- rem, 6c eftamparem a Ilha de Santa Elena , c}ue muyto ftftejaó em quantas taboas a ellampaó.E pois os coílarios aquém elJa naó per* tence tanto a feftejaó,fó peio que ella em fua paragem importa aos que nella portaó, me parecco naó paílar por ella depreíla, fem tra- tar de feu íitio , 6c propriedade , por quam afamada he pd j mun- ,do. E para melhor fe entenderem algumas coufas que delia toco, mandey eftampar a planta deila, naó pelo frontcfpicio fomente como fizeraó os Olandezes , mas com toda a regra da Cofmogra- fia, com todas fuás pontas , enleadas , 6c nbeyras , na forma que fe vè eftampada no cabo deite capitulo , advertindo que fe piefu- C poeni iZ 7roiadodo fucefjfo põem nella que fe vè a Ilha toda a húa viíla , por cuja razao cftaÔ todos feus montes , & rochedos de que he cercada , 6c formada á parte interior, que de outro modo naó fe lhe poderá ver mais que o frontefpicio fe fe houvera de moílrar fragofa. Efta Ilha eftá dezafeis grãos & dous terços do Pollo Auftra?^ • tem duas legoas& quarta de comprido Norte Sul , ôc de largo le-, goa 6c meya , tem oportoaLoes Noroeíle abrigado das mon- ções, que fazem a mais cofta tormentofa.Diíla eíla Ilha de Lisboa 1 1 00. legoas, 8c 2000 de Goa, 6c do cabo de boa Efperança 520. 6c ^40. do Braíil ,6c de Angola 570. 6c 1 100. de Moçambique, 2c da Mina 375'.Foy defcuberta no anno de i foi qne ha hoje cen- to 6c dous annos em vinte 6c dous de Mayo , dia de Santa Elena, pelo Capitão mòr das noílàs Náos da índia , Joaó da Nova vindo de torna viagem, 6c tantos annos ha que a Coroa deite Reyno ef- tá de poíTe delia, 6c que os Portuguezcs nclla foraó lançando por- cos, cabras, coelhos, perdizes , de que tem quantidade i tem gali- nhas mayores que as átGuinh : tem muytas pombas, 6c rolas, teto muytos gatos bravosque fazem íer menos os coelhos,6c perdizes: tem muytos ratos, 6c formigas, 6c naó tem mais bicho algú. Tem algúas parreyras de uvas, tem todo o anno figos berjaçotes , bons grandes , 6c mclofos , 6c que em húa noyte amadurecem , tem li- moeyros, larang yras, limeyraf, romeyrns. Pelos vales , 6c fundas ribeyras tem muytas arvores , muyta parte das qunes fiiõ gingey- ras bravas, 6c outros ( a que algus querem chamar Dèllios ) qiie • fazern a figura de falva ai folha , 6c difbilaõde feus troncos huma ,razina, que he tida por beijoim, 6c rJgús a trouxer.ió de lá pc)r ef- fe , 6c o venderão por tal. Tem húas ervas de tinta azul , como as que I'.a em Cabo Verde, que daó tinta finiílima com que tingem ♦os panos , que de lavem , que nunca diftingcm. Tem pt Ias plani- cias multidão de nabiças de comer. He fragofa , 6c muyto mais o parece, porque he dcferta, 6c naó tem eftradas, fuás ladeyras íaó de pedras foltas, que fevaóhÚRsapoz outras facilmente. De todos feus montes manaõ fontes de muyta , 6c excellentc agua , que a fa- zem frefca, 6c provida de muytas ribeyras , de que lodahe cerca- da. Húa das quacs da parte do Sul fe converte em f^litre , de que fc pôde fazer carregação , 6c já foy trazido a Lisboa , 6c vendido para pólvora na náo Capitania de João Gomes da Silva no anno de Do Galeão Santiago. i ^ .de noventa & íete. Tem muytas lagoílas , 6c alguns caranguejos, i(&C nenhum marifco. O pefcado íaó xarèos, garoupas , fargos , bo-; íleaes , cavalas, Sc moreas, 6c tudo fácil de pcfcar , 6c em grande a*" bundancia. Todas as madrugadas infalivelmente chuvifca nefta ilha , & como nafce o Sol faz rermofo dia. Correm nella as aguas de Nordeíle Suduefte , 6c por eíla caufa , Ôc ferem os ventos poi* f ima da Ilhji, com monçaófe tinha por opinião , que a todo o na-i vio para tomar o porto nelln, convinha ir tocando o efparavèl , 6c íe naó qijciogo dcfgarrava, 6c perdia o furgidouro , 6c por efla ra- Zaó o regimento uo Vifo-Rey Ayres de Saldanha ,q deu ao Capi- tão mòr António de Mello dÍ2Ía,como fica referido^que ancoraíic ou ponta do eíparavcljonde ficava feguro dos inimigos o poderem tornar a bufcarjfc no porco cítiveílem. Da qual ponta poderia tâmbem defender a entrada no porto aos inimigos, íe ovieílerri bafcar. Porem ncíle íuceíTo dos Olandczes, moítrou iílb melhor a experiência, 6c que a antiga opinião, naõ ha iugar (tnm nas noílas Náos, que vem da índia carregadas, 6c faõpezadiííimas, 6c muyto metidas, 6c em que as correntes, 6c ventos fazem grande preza,não ío na Ilha de Santa Elena , fe não em toda a parte do mar» E aíHm também naó ha lugar fazer reparo no eíparavèl , com artilharia como o regimento dizia, pois vemos que os inimigos, vaõ na vol^ ta do mar, 6c tornaõ a ferrar por balravento , 6c melhor fe afafta- lúàò dcíTe reparo , Êc tornarão na volta do porto mayormente, que o efparavèl he com porto de rocha altiííima , 6c de pedras taô foi*.» tas, que dá pouco lugar a eíies reparos. Em tanto que lançando-íc do Galeão Santiago, hum galgo, que nelle trazia da índia Alvará Velho, fugido a terra a nado i atemorizado da batalha , 6c trepan-<| do pelo efparavèl , três vezes oviraó tornar por elleabayxoent tpmbos ,pclo lugar.por onde na eílampa íe moftra , porque na5. pode pegarfe pela rocha , por quam folta he toda , 6c láife íicou o galgo na Ilha. Depois de partido deíla Ilha o Cícaõ Santiago , 6c :)3 01andczes apozelle , chegarão a ella osdousGaleó-S ác hm companhia, o Salvador, 6c Saó Joaô, queparnraó de Cochira , 6C ^cháraó na Hermida deSanta Elcna hum paynel, 6c pintado neH iea.dito Galeaõ , pelejando com as tres Náos Olandezas, com hu letreyroem Flamengo, que dizia : Eíte Galeaõ Capitania d: vos- Qtucros.vay. ptíejívn ao çomeílas. tres Náos OLindezas , Ecáraó . ad- >w... -j ' G 2 mira- 10 • Tratado dofuceffó^ iiiirado3 de ver o paynel : 6c por clJe , 6c por acharem corpos mxyu $QS, ôcaancorano eiparavél, & o cabo na rocha : entenderão ò que havia foccdidoà Capitania, & quanto a mim na Ilha ficàraó Qlandezes , 6c divia de (tv algum o artiíice que levavaõ para Ihè debuxar as terras, como debuxou a eftailha. Porque naõ teve tempo para pintar naquella quinta feyra da batalha o paynel,mòr» mente que o ktrcyro dizia. Vay peleyjando. Irfehiaó depois nas outras fuás efquadras , que erâo t imbem na Sunda. C AP irv LO Q^VINTO. Va Batalha quç o Galeão Santiago teve com os Olandez.es o dia da Sefiã fejra qnefe defamarroH do ejparavèl, Efamarrado o Galeão àfefta feyra lhe amanheceo , como fica d' to ; naõ caminhou fó muy tas horas , porque o inimigo fe fez apoz elle à vella, com as fuás três Nàos , com que em breves horas o alcançou , 6c pondófe-lhe pelas quadras com as duas com- bat ntcs do dia dantes , levou de trás por fua efteyra femprc paci- fica a terce yra Náo , a qu J em cafo negado que fora doutra efqua-* dra , & que naõ tiveíle ordem de pelejar ( como depois quizeraõ dizer) ainda que quizera entrar na batalha naõ tinha lugar, por- que com as duas fe começou de dar continua bateria por popa^húa de húa quadra , 6c outra doutra revezando* fe , 6c difparando aar-. tilharia de huma banda , em quanto a outra refccia , 6c a ctrcavaõ de tal maneyra,quc naõ ouve cm todo aquelle dia horn, nem mo- mento que no Galeaõ naõ empregaiTem contínuos pelouros re- forçados , quafi todos ao lume d'agoa, recebendo delle pouco da- no por naõ trazer peça alguma em popa , como por naò poder ju- gar da fua artilharia em forma muy oíFenfiva. Porque como hia a balravento , bl o inimigo por pop3,era forçado para a fua artilha- ria fazer pontaria atravcSarfe . 6c defras gumadas fe defviava o ini- migo como queria , porque lhe feguia a efteyra quando fentia que< fe atravellava para dar batcna,6c poucas vezes podia o Galeão em- pregar fua artilharia, nem fazer com ella pontaria fem featravelig^ &r de todo , pela eftreytcza das portinholas , 6c empacho da muy-' ta fazenda com que as peças fe mõ podiaó bornear fe naõ dcrey* tas , de tal miodo, que para a pontaria que a peça havia de fazer, conyi- Dô Galeão Santiago. ti fonvinha virar tanto o Galeão que Ihafuprifle, & defta raaneyra recebendo elle do inimigo por popa , ôc pclis quadras continua bateria de fua artilharia ( queafeu falvo jugavaô) íe cerrou a nói* te, havendo algus mortos, 6c feridos no Galeão , que iicou hú cri-, yo de pelouradas, ôc muytas delias , muy profundas ,^ por onde recolhia tanta agua, que ambas as bombas de nenhum modo ven- ciaó, & nas velas, & enxárcia houve tanto eftrago,& o mafto gra- de paíTado por tantas partes, que fe efpcrava que cahifle pelo pou-í- CO beneficio que fc lhe podia fazer em tal tempo,& foy neceílario pòr na vergi hús antigalhos por fe naó vir abayxo , fegundo eíla- Vâ aenxarcia. Com tudo ifto fe dobrou aos noílbs novos cuyda- dos, & muyto mayor trabalho naqueila noy te em que naó defcã- çou algum , efpecialmente por acudirem ás bombas , vendo que tinhaõ já mais contra fi o mar. Porque n.fte dia o calafate Jofeph Dinis andou embalfadojpela parte de fora a tapar buracos eftando por alvo dos continuos pelouros do inimigo, & com tanto animo que admirava a todos, & pofto que tapou muytos , havia muytos mais, Ôc a que com a marcta fenaõ podia chegar , por eftarem pro* fundos, nem por dentro erapoílivel chegarftlhe por quam macif- fo vinha o Galeaõ com fazenda. E eíla nova de fenaó poderem ta- par os buracos, & das bombas nlo vencerem a agoa, entriíleceo a muytos, vendo que a fortuna lhes punha já ©bftaculo?, & diíficul- dades, a que as forças humanas naó baftavaó remediar, 6c em efpe- cial, porque também oGaleaó pelo defconcerto das velas , ôc en- xárcias dava já mais pelo leme. Deu-fe fundo aos mortos , 6c cu- rados os feridos como foy pofíivel , fe concertarão as enxarcias,& fcfizeraõ outras coufas neccíiàrias , naó cefiando ocuydadodas bombas já naquelleeftado mais importante que tudo. O Capitão mòr vendo que o inimigo com lhe ficar por popa combatendo-o o não podia offender com a fua artilharia como convinha , mandou abrir pov popa duas portinholas , 6c arrombar para iílb hús cama- rotes,& po2 nellas dous facres , que fe trouxerão de proa, com aí- faz tiabaí bo , pelo empacho de Galeaõ , 6c por eftar a gente tref- noytada,6c cançada,ôc entendendo os noffos,que depois de Deos, a fua falvação confiftia em abordar o inimigo com eíles , 6c virem ás mãos. Ordenou o Capitão mòr , que logo fe fizeíTe húa bandey- ra vermelha para que larga por popa em^manhccendo\ cntendef-, Ç 3 fe t % Tratado dòfucelJo ^ feo inimigo por ella que tinha ainda muyto que fazer , & que naa levaria íeu intento avante ás bombudadas , 6c lhe corapria. abqr-í daro Galeão fc o pretendia render , & fe^ tanto os obrigaíie «i ço-j bicada preza, que delieefperavaó. C AP ITV LO S EXT Oyi,. ::::.. B^fiíceljo do Jab^ado , & forma em que o Galeão Je;. rcndeol > h AManhecco o Galeaõ ao labbado na forma que eílá dito com fua bandeyra vermelha por popa , da qual o inimigo parece ientiro para que fe poz , 6c entendendo , que convinha abordar.o Galea6,meteo nas vcrgns de ambas as Náos combatentes huscom traláes com certos vafos de fogo , que moftravão tençaó , òc pre^ vençaó de quererem abordar o Galeaõ, o que os noflbs muyto fet ftejaváo por cuydarem que veriaóaoscabcllos, (como def javaóX & vindo nefta forma hum bom efpaço , mudarão coníeiho, & tor-* jiáraõ a tirar os contraláes,6c contitiuáráo húa no va,6c terribel baí teria de artilharia com que nefta manhã matárão,ôc ferirão algúas peílbas. Os do Galeaõ naõ ceíTavaõ com os feus dous facres , com que fe enxergava, que o inimigo recebia algum dano , porque fe. arredava mais. PorèmoGaleaò fazia tanta agua , que lhe eraõas bombas já de balde, nem as diligencias do calafate , que por ÍLrení animofamente feytas , fempre foraó de muyta eííeyto , fc ornas naõ andara taó picado , & o Galeaõ já tão metido , de modo .que naõ chegava aos buracos profundos. Ajuntou-fe a ifto o grade ef- trago das enxárcias, & velas dos muytos pelouros de cadea , difpa- TíKÍos nella de propofito , com que fe arruinou tudo de maneyra, que fenão tinha a verga já fenão nos antigalhos.Quando fe arrom^ bou hú payol de pimenta , com a qual fe entupio a dalla das bom* bas, ôc ellas de todo fem fervirem para nada , com o que , 6c com a muyta fazenda que a noyte de antes fe tinha alojado ao mar ficou o Galeão defarrumado, & tão dcfcompaíTado que não governava* 6c com-os balinços que dava por andar o mar picado ficou anho*- to, 6c a mais da gente tão defcófiada da defenfa, que fc foraó muy* tos ao Capitão mòr , dizendo4he , que já que a fortuna os tmha chegado áqu.Ile cílado , & irrerniílivcímente fe hia o Galeaõ. ao fundo^por momentos , lhe rcqueriaõ que fe cntrjcga/lcm,, &. mé per- Do Gale ao Santiago. 313 pcrmitiíl*e que morreíTcm todos afogados ,pois careciaô de reme- dio humano para fe poderem defender. O Capitão mor lhes ref*. pondeo que fe lembraílcm que eraó Portuguezes a quem em fe* melhantes fuceílbs o temor da morte não fizera nunca perder o ponto da honra , ôc obrigação de cavalleyros , ôc que efperaíTem pela noytc, com grande confiança em Dcos,que tinha muyto que dar 3 porque também era de advertir , que os inimigos tinhsõ dif- parado tanto numero de munição, que era coufa impoffivel terem já com que os oífender , & que eíTa falta os obrigaria a abordarem, ou largarem a preza, ôc com eftas , & outras palavras acomodíidas aoelladoemqueeílavaójOS aquietou animando-os , que cada hú tornaílè a feu officio,ôc que cerrada a noyte alojariaó muyta fazcn^ da,& defemtupiriaò as bombas , & que em Deos efperava ,que fe haviaõ de defender com muyta honra. E nefte paílo moftráraõ os fidalgos, & nobres bema galhardia de fua cavallaria,& fangue aju- dando ao Capitão mòr muytos delles , a aquietar aquella turba a- motinada, &: defcorçoada, elperando todos que fe fe defendeílcm tnais hum dia , gaitaria a munição, (porque elles não fabião quam provido delia eííavâo) 6c que depois bem fe faria.Quieto eíle mo- tim, 6c tornado cada hum a feu pofto , bí obrigação , não bailou â fobcja conftancia dos do Galeaõ a fuftentallo fobre a agua , por- ■que ciaram enteie enxergava, que fe hiaao fundo com os novos buracos , que recebia de contino. E defenganada'agentediiloque lhe balizava o coílado por fora, ôc por dentro , fe levantou hum fufurro entre elles, & pailada palavra, que fe hiaõ ao fundo, tor- narão com grande motim ao Capitão mòr,levando comiigo o Pa- dre Frey Feliz, com hum Crucifixo nas mãos ,o qual lhe reque- reo em nome de todo aqueliepovo,que pelas Chagas de noílb Se- nhor JESU CHRISTO fe quizeíle entregar, atento ao eíhdo em que eílavaó , ÔC que fe elle tão claramente queria perder a vi- da jttão quizeíle perder a alma, deyxando morrer toda aquella gente , que outro remédio não tinha já fenão entregai fe á difpofi- ção do inimigo. A eftas , 6c outras palavras , que naquclle paílb o Padre Frey Feliz foube reprefentar , refpondeo o Capirão mòr: Já voíla reverencia ttm muyto bem comprido com oofíicio de bom Religiofo,6c Prègador,agora me deyxe a mim fazer o de Ca^ piiãoi& pedindo a todos que íc aquietafiem , 6c lhe obedece íleip como % 24 Tratado do fticejjé como erão obrigados , lhe diíle Manoel Ferreyn efcrlvao |dp Ga» leão que pozeíle o negocio em votos. O negocio rcfpondco tllc^ não he de votos no cílado em que cftamos , mayormente quando fe nie pede pela mayor parte-da gente , que me entregue. Emefte paílb fe chegou a elle o Meílrc Simão Peres , & lhe fallou à ore- lha, ôc como vinha de ver o porão , 6c não falou em publico coli- girão que o defcnganava , que o Galeão fe hia ao fundo por mo.» mentos , & porque hum dos que mais perto íicava , ouvio hum» ipalavra ao Capitão mòi fignificadora diílb , que era , poi$ ajudallp a ir, ôc o Meítrc lhe tornou ; pois logo volla mercê , quer morrer,, pois fe iífo quer , também eu morrerey com elle. Elbs praticas ainda que eraó entre ambos , ôceftava agente aellas taõ acento, que coligindo o que paliava , levantarão a vòz quafi todos cora grande motim j pois fe voílas mercês querem morrer , nos quere- mos falvar as vidas , pois não aproveyta pelejar, nem hà remediQ de defenfa , & defobedecendo ao G. pitão mor a mayor parte da gente fe fubio o motim ao capiteo , Ôc por mais brados, ôcdih' gea- das do Capitão mòr, felhedefobedcceo, 6c fe largou por popa humabandeyra branca por hum oííicial doGnleaô. A qual fendo viíla dos inimigos , ceflarão com a bateria , 6c vierao a bordo dellc com tuas lanchas, a donde o Capitão mòr , não pode deílliadir aturba mutinada que não deíle pacifica entrada aos inimigos,(que clles jà defejavão mais grangear por amigos , que efcandaliz-allos.) E dados reténs , entrou o Capitão Cornelius atè à varanda oiide o Capitão mòr eftava retirado , vendo- fe defobedecido, 6c acompa- nhado de alguns que nunca o defacompanhàraõ , Cornelius o íàl- vou corn as palavras coftumadas entre Capitães, vencedores , 6c -vencidos , 6c confolando-o que fenaõ agaftaíle que erão fuceílbs deguerra , 6c da fortuna , 6c que por quam bem o tinha feyto ellc lhe prometia cm nome da fua Republica toda a fazenda que trazia no C^ahaó , 6c que lhe entregaíle logo o livro da carrc gação, 6c aíi vias , regimento , 6c mais papeis que trazia , com toda a pedraria. Aíitonio de Mello lhe refpondeo : eíle partido Capitaó fazey vos com os que vos entregarão o Galeão , 6c vos chamarão , 6c dcyxà- rão entrar, que eu não hey miller mercês vofiks , nem da voíla Republica, que Rey tenho para mas Fazer ; nem eu tenho parn que vos entregai' nada , porque me não dou por vencido , íe não quando Do Galeão SúÈtiago. i| quando vòs me abordardes , 6c renderdes pelas armas^ Aeftare* poíla voltou o Olandez , colérico às fuás lanchas , dizendo \ ainda iêa Gapicàò não queres ? & levando às fuás Náos as peíToas que tí4 nha nas lanchas cm reféns , tornou a voltar trazendo gente íua ar*' mada. O que vendo o Capitão mòr , 6c que a fua gente ja naõ tra- tava das armas, nem havia lugar de outra coufa,tomou as vias, 6c o livro da carreg çaó , 6c bom golpe de pedraria , 6c atando tudo, elle com Ruy Pereyra , 6c com o Mcftrc Simaó Peres , lhe derao fundo com huma corja de porfelan «s , eílando outras peílbas pre-. fcntes na varanda, que fe efpantàraó do perigo a que fe punha, vif- to o que paílara com o Olandez, ôc cUcos fatisfez com dizer que pcrcccíTc embora a fua vida, 6c náopereceílc hum pomo de íliát obrigação , nem quizeíFe Deos que os inimigos foubeílem os fe- gredoi de Sua Mageílade pelas fuás vias que botara no mar,6c que dos que prefentes eftavaõ cfcapaíll^m , ôc foliem a Portugal íe-; riaô teítcmunhasdecomo feouveranaquelle particular. Entra- do Cornelius com gente fua darmas dentro no Galeaó , tornou-fe, á varanda , 6c íabendo que nãahavia vias , nem livro de carrega- ção, 6c o que o Capitão mor fizera , colarizou-fe muy to contra elIc, 6c o tratou com muy tos difprimores, 6c o fez logo paílar àfua Náocom feu filho Francifco de Mello que eftava muy to mal das feridas, 6cpedindo-lhe todosbs mais papeis que tivclle pedra- ria , o Capitão mòr lhe refpondeo , que elle , neni papeis, nem pedraria tinha que lhe dar, que no Galeão eftava , que o buícàíTe cllc, 6c que fó húa coufa lhe pedia que muyto eílimaria , pelo que lhe hia niílb que era o feu regimento , pois elle era Capitão , 6c fa* bia a obrigação que elle tinha de moíirar que guardara a ordem que fe lhe dera , 6c que quando o naõ quizcíle dar , que Sua Ma- geftade teria a iíTo refpeyto , para a defcarga que lhe era elle Capi- tão mòr obrigado a dar. Cornei lus lhe diíle que fe embarcafie, 6c que elle lhe prometia de lho dar , (como de feyto lho mandou dar na Ilha de Fernão de Noronha , dcyxando em fua mão o treC- lado. autentico pelos feus efcrivães, ^ 6c o f^^z embarcar, 6c paílàr á íua Náo com feu filho , 6c com outros que lhe parecto divia de ti- rar do G.deâo. E feyto ifto começarão logo amigos , 6c inimigos a trabalhar fobre o remédio do Galeaó com quantos meyos lhe tb- raó poíTivcis atè que fe cerrou a noy te , que os uiimigos náo qui- ; .. . D zcrão 3^6^ Ir fitado dofucejjo 5:eraõcrpernrnaGakTiõ,não fc líavcndo por fcgaros nelie,& re- tirados ás fuás Náos , ficarão os noílbs tão atemorizados aquella Doy te de fc foverter o Galcaó , quanta era a razão que para ifio ti- iihão , 6c não focegando ate pda manhã , confiília o feu repoufo das canfadas noytts,6c dias atraz, em alojar quanta fazenda podiaó ao mar, ôc cm outras diligencias que entendião que lhe convinha, ( que em taes cftremos tudo f ló traças por íàlvar a vida ) & por- que além das informações que tomey particularméte por peíibas de credito , de que tirey o que tenho cfcrito achcy huma certidão de Dom Pêro Manoel , que conta o fucefib defta batalha , ate o Galeaó fer entregue , a qual tnxeri aqui , 6c he a feguinte. € E RT I B A M, PArúnào António de Mello àe Caftro Capitão mor àa6 Náos do Reyno defta Ilha de Fernão de Noronha em hum batel para o Brafil para «f- gocear remédio agente da Náo Santiago que os Olandez.es deytaraÓ na dim tA Ilha , por ir muyto doente , ^ arrtfcado na embarcação mepedio huma certidão do procedimento que na dita Náofe tivera com os Olandez^es na f eleja que com elles teve. O q^epajjou na forma feguinte: ' Findo a dita Náo demandar a Ilha de Santa Elena , conforme a or^ dgm 5 & regimento de Sua Mageftade^& defcubrindo o porto da dita Ilha, *vimos nella três Náos de coçartos Olandez^es , com muytas banáeyras , (^ tjtendartes. E indo o Capitão mor com a dita Náo Santiago , prefies na melhor forma que pode fer para fe dejfender , & offenderpoz. aproa na ponta da Ilha , onde chamao o efparavel , que era o lugar em que o regimento de Sua Mageftade mandava que furgilfe. E antss de chegar a eUe fefiz^eraÕ 4Lvella do dito porto de Santa Elena duoi Náos dos inimigos : & vindo na -volta do mar , vierao furgir quafi a hum tempo no dtto ef^ arável muyto junto à dita Náo Santiago , começando-fe entre todos huma brava bateria, de bombardadas , com muyta vantagem dos inimigos , affim pelafaz.erem na differença da artilharia , por terem muytos canhões de bater , & muyto mayor quantidade ^como pelas muytos mumçoes extraordinárias com que nos combatiaÕ ^& a[fimpaffou todo o dia , ate que ao feguinte de madrugada nos pz.emos a vella por poder pelejar no mar , ^ atraveffar a Nao , o que furtos náo podia fer ^& os inimigos nos combaterem pela proa , o nde não ti' nhamos artilharia cora que çs ojfender. Finalmente no dito dia , & nos dons mais Do Galeão Santiago. ^f vtals que durou apelejt^ , o dito Capitão f^^or cumpria eoínfeucArgo , coma de talpelfoa ,& tão experimentado na guerra Çe podia efperar. E no ultimk dia fendo a Náo d.e todo defaparelhada de enxárcia , veílas^ ofiagas, c^ elídp (fido cortado , o maflo grande paífado por muy tas partes , tendo-je a verga fo» mente nos antigalhos , que ihepoz^erao ^ò* fohre tudo não fe podendo venctr a agoa quefaz.ia das muytaspelouradoi que tinha de^ayxo da agoít^^ ven^ do agente^ & ojjiciaes da Náo que [e hiao ao fundo , requererão todos aa dito Capitão mor que Je rendeffe , & nao permttiffe morrerem tod^os breve^ mente afogados. Ao que rejpondeo que ejperava em noffo Senhor que tudok teria re-medio , que pelejaffem somo tinhãofeyto , & que ejperaffem a noyte^ na qual alojar iao tudo o quefoffe pojfivel ao mar , & nao lhe ficaria nadai porfaz^er, & que confava na mifericordja de Deos queje h avião de deffen» der ; animando-os com todoó as mais palavras em tal tempo neceffarias, (dr^ porque expreffamente todos os ojfciaes , differao ao Capitão mór que não ti-^ nhão Náo ,& que fe hiao ao fundo ^foj requerido por muy tas pefjoas qus- tomaffe votos ^ &poz,effe o negocio em confelho , ao que rejpondeo que nao ré'" folntamente , & que nao havia par a que tomar votos , nem era matéria dei confelho fenao de nos lembrar que éramos Chrtjlãos ^ & Portuguez^es , d* noffas honras , & que era a Náo de Sua Magefiade , & que emfe render fk perdia muy to maus que em morrerem todos afogados , cu ejpedacados da ar^ filharia , que ainda havia muy to quefaz^er , que ninguém defamparaffk a dita Náo , nem deyxajfe feupofto. Ao que geralmente , d" alguas pejfoás' em particular , quefefua mercê queria morrer^ que elles não queriao ^pois fe hiao ao fundo , nao havendo /a nefie tempo quemfojje ao leme , nem ca^ deyra , efiando a Náo no mayor extremo a que podia chegar. E com a repof- ta do dito Capitão mhr Jefubio muy ta gente ao capiteo , &fepoz. huma toa^ lha , êu bandeyra branca^ chamando aos inimigêsfem valer ao Capitão mole bradar , que lhe não defobedecelfem, & dtz^endo , & faz^endo todos os officios que hum valerofi Capitão , cercado de tantos trabalhos podia fazer ^ & poy tudo pajfar na verdade , o certifico pelo juramento dos Santos Evangelhos^ CÍ* ajfmej aqui ao derradeyro de Abril de 1 604 . Dom Pêro Manoel» D z CAPU * ^ ^^ ata do do fucejjo A CAPITVLO SÉTIMO. Do UmemofofHceJfa do Domingo'* O Domingo toriiàraã os inimigos ao Galeão para ver Çtó podiaõ remediar , 6c mandando a nove calafates erri que en- trou Jofeph Dinis , & oyto Olandezes , embalfados por fora do .coílado, a tapar os buracos a que podeílèm chegar , com que o Ga- leão eftava fcyto hum crivo. A mais gente Portugueza , & Olan- dezes entenderão em alojar fazenda ao mar com toda a outrA cou- faque Iheparcceo pcfada,& porque as bombas eílavaò emtupi- Idas fe ordenarão muytos gamotcs» pelas eícotilhas ,que fupriílcm à falta das bombas. Os quaes gamotes tinhao também grande em- nella.como morto cm quanto el- Do Gale ao Santiago. %$ les Te occupavão na morte dos mais,ficoa ãlli cpm vida. Afaílados os Òlandezes com a&lançhas do bordo do Galeaó , quanto bailou para lhe naó faltarem ncllas , encaravão as armas a todo o que ifto cometia > & detiverão^fe alli hum pouco , por algumas vozes que idelleouviaó (que tomaíTem pedraria. ) E a alguns que Ihemoí^ travão biíalhos della^ tomavão , ôc a todo o outro que cometia en- trar matavão cruamente. Vendo o Meftrc Simão Peres que o ne» gocio hia por aquella yia , moftroulhes o apito de prata com fua cadea,& por elle o tomárão.Hia nefte Galeaó hum bombardeyro^ chamado Vicente Fernandcz,fugido defte Reyno para fe ficar na índia , temendo fer enforcado por hú homem do termo , que ma- tou mal a São S.baftiaõ da Pedreyra de Lisboa. Vendo eíle que os Olandezcs não tomavão L não quern tinha pedraria, deteriiu- nou ácÍQ. lhe arremedar nas lanchas, de cima da varanda , quando fc krgaílem , ôc preparafíem por popa : para iflb atou nella hu^ corda em que fe embalçou com taes voltas, & Iços , que ao tem* po que fe quiz lançarem huma lancha , fe lhe embaraçou a corda nopefcoço, de modo que ficou por el^atnforcado, & cflando perneando com a morte , lhe não quizeraó os Olandezes valer , 6c íc afogou ,ôc morrco enforcado com as íuas próprias mãos. , per, mittindo-o Dlos aílim por feris fccrctos , & juftos juizos. A mais gente quando vio que os inimigos naõ tomavão fenão a quem lhe dava pedraria ( que poucos ti nhão ) ôc aos outros matavão, entra- raõ em mayor defcfperação da vida , ÔC com huma triílc defcon- folaçaó poftos ni^is por fora do coílado , efpcrando por momentos goftar a amarga morte , davaô deíefperados gritos pedindo mife- ricordia aos inimigos que claramente os ouviaó, & nenhúa pieda- de tinhaõ. dílles. O Capitão mor António de Mdlo naó podendo fofreraquelle triíle efpeólaculo em que via eílara fuagente, fe foy ão Capitão Cornelius , ÔC lhe diíle que jà que o foubera ven- cer com tanto valor, ofoubeífe moílrar em feapiedar daquella gente Ghriftãa que via ir ao fundo diante de feus olhos , pcdindo- Ihe mif.ricordia. A efta petição taó pia ,acudio hu Olmdez ( que alguns dizem íer Lourenço Bique feytor daquellas Náos ) ôc pe- gando pelo cabí çaó ao Capitão mòr , lhe deu hum avnno , dizcn- do-;lhe : iiaó pcçaes ta^que naó queremos dar vida a inimigos, ôc .vcsos haveis de ir .também, logo acompanhar ao fundo , pois que D 3 podcn- 3-Q Ir atado do fuceffo podeiído-vos render cm tempo os dcyxaftcs chegar àqudle efta-. do. O Capitão mor parece que como qu-em jà cínmava maÍ3 mor- rer com os amigos , que viver entre tacs inimigos ,lbe re.íppndeo^ a mayor mercê que me podais fazer, he mãdardes-me meter entre' elles onde eu bem defejey acabar antes a vida que verme a mim, & a elles como vejo. Os do Galeaó affim trefpaírados , vendo-íe na infelice hora da morte que por momentos efperavaó,por o Ga^ leaó eftar já taó metido , ôc cheyo de agoa que parecia milagre n:ió fe fobverter, 6c defefpeiados de acharem piedade , em hereges ce- gos em tudo, tiràraó os olhos delles, 6c pondo-os com toda lua ct- perança no Ceo , pedindo a Dcos mifericordia com grande con- fiança,fe lhes cerrou a noytc,6c cobrando hti novo annno/nais de- cido do Ceo , que de fuás foi ças , remeterão hús aos gamotcs , ou-, tros alojar fazenda , 6c artilharia ao mar , 6c rezando de continuo huma devota Ladainha , acompanhada de lagrimas , 6c fufpiro% aprovou Deos ouvillos , 6c que o Galeaó fe tiveíle fobre a agoa atè pela manhâa , que foy notável maravilha , 6c grande confufuó, ta cfpanto para os inimigos , no que lhe Deos moílrou bem que fó à fua Divina Mageftade fe há de recorrer em taes apertos , 6c pedir piedade , 6c mifcricordia. CAPITVLO O TT AV O. DofiiceJfodafegHndaffyra» AManhecendo a fegunda fey ra o Galeaó fobre a agoa que foy coufa maravilhofa , 6c mais que ordinária, 6c picados os inimigos da cobiça , parecendo-lhes que pois o Galeaó íc nió fob- vertèra aquella noyte ainda poderia ter algum remédio , 6c quan- do naõ , tirariaó delle alguma fazenda, tornarão a elle mu y tos pa- ra trabalharem vendo" que a nolfa gente citaria já cançada , ( co- mo eftava de tantas noytes, 6c dias de fadiga , ) 6c entrando cor- tarão logo o mafto grande que tinhão por muyto psfado , 6c que não aproveytava para navegar com tile , por eftar tão crivado , 6c efpedaçâdo , que não poderia efperar , verga , nem vela , 6c corta- do o lançarão ao mar , com verga, gavia, 6c tudo , 6c apoz cl le alo- jarão muyta fazenda com aílaz magoa de feu coração, 6c fey ta toda a diligencia com calafat':s por fora do coitado , que fuziam \ \ ^ " gr/nde Do Galeão Santkgo. ^t grande efSFcyto por eftar o mar mais lançado , 6c quieto, & eom os gamotes pelas efcotilhas , chegarão a eílado , de fe defemtupirem^ as bombas, vazando com ellas, & com os gamotes a agua por gra- de eípaço 5 a chegarão a vencer ; porque o Galeão cora eílas áilU gencias ( &efpecialmcntepor fer Deos fervido , de fe apiedar da- quella gente , queefta he a verdade, ) hia defcobrindo o coftado, & os buracos profundos,dando lugar aos calafates os poderem ta- par, atè que fó cora as bombas chegarão a vencer a agua, com tan- ta alegria dos noflbs , que choravao com prazer dando a Deos in^ finitas graças por taó maravilhofa mercê , conhecendo que de fuá infinita bondade Jh^s refultára o remédio de fuás vidas , ôc naó da fraca diligencia de feus braços , com que fe abraçavão hús aos ou- tros pedindo-fe alviçaras, com tanto prazer como fe fc viraõ den- tro na barra de Lisboa a falvamento. Vencida pois hua taó gran- de difficuldade fe pozeram à trinca os inimigos alguns dias atè fa- 2ercm navegável o Galeaó , affim do cftanque da agoa , como de vellas de proa , em que havia mafto , poílo que roto , & desbarata- do , 6c continuando as bombas , feguiraó a derrota da Ilha de Per- uam de Noronha, 6c expedirão logo dalli a tcrceyra Náo que naõ tinha pelejado , na volta de Olanda , a levar nova da prezn, 6c para que fe lhe feguraíle hum paço de Dunquerque , quando là chcgaílem, C A P ITV L O NONO. Do que pajfárao atè a Ilha de Fernão de Noronha , do modo com que os Olandez.es tratarão os PortugHez.es , & es lançarão nella. DEpois de pacificas as trovoadas , 6c tribulações que houve no nofib Galeaó , fe admiravaõ os Olandezes de o ver taó- cheyo de fazenda havendo que fó o que delle fe tinha alojado, era baftante para carregar huma grande Náo , diziaõ aos nofibs : Di v zey gente Portugueza , que naçaó haverá no mundo taó barbara, 6c cobiçofa que cometa paliar o cabo de boa Efperança na forma que todos o paíTaes, metidos no profundo do mar com carga pon- do as vidas a taó provável rifco de as perder , fó por cobiça , 6c por ifib não he maravilha que percaes tantas Náos, 6c tantas vidas; 6c o que mais nos efpanta he ver que mó vindo cite Navio , nem para ^t Tratado do fíiceIJo para navegar , nem para pelejar, vos punhais muyto de ciíb a queiS i rerdes^batalha com noíco. Baila que eílavaó admirados de ver o ] Galeaó , naqucUe cflado , já que fizera íe o viraò como parcio de ] Goa i porque naó fendo clle de porte das Náos de carga , íc naó \ muyto mais pequeno , ÔC fraco , trazia mais fazenda que a mayor \ delias , & fó no poraó quatro mil quintaes de pimenta, que era outra tanta como as dua^ Náos inimigas com que pelejou traziaõ j por carga da índia dous mil cada huma fomente lem mais nada, \ pollo que fjy pela razaó apontada no Capítulo Segundo. E íllim \ vinha o Gakaõ a mais ri. a Náo que muytos annos havia pirtiria - de Goa. Pozeraó até a Ilha de Fernão de Noronha 22. dias , nos \ quaes foraó os Portuguczes tratados cruelmente dos inimigos' \ com todos os diíprimores poffiveis que íenão poderão cíperar de \ gentebarbara,6cantesde os lançarem em terra, tlcgèraó dous | Olandezes que entenderão , que erão para aquelie etí^by to apro- priados , os quaes fbraõ paliando aos noílbs hum , & hu pela buí- i ca do corpo, Sc veílidos por vierem íe deíen^barcavão com alguma | pedraria , ou peça de ouro , 6c digo pela buíca do corpo .6c vefti- \ 3os, porque não íomence os diípiáo, & deícalçavão, 6c davão buf ■ j ca pelos veílidos, ôc partes exteriores , mas ainda pelas interiores, \ atè lhe meterem por ellas os dedos , ôc em que lhe pez lhe faziam \ beber hum copo de vinho para lançarem da boca alguma pedra fe \ nella levaílcm , ôc fó o Capitão mor António de Mello por mais í honeílidade o bufcárão dentro em hum camarote , ôc os próprios \ Capitães Olandezes o defcalçàraó , ôc o bufcárão fem lhe acharem \ couía algúa , ôc o que os noílbs mais que tudo fcntirão, ( ÔC com : razão ) foy o eftrago que eíles hereges fizerão em alguas Imagés, \ que alcançarão á mão, ÔC veftiraó-íe por ludibrio em hGa cafulla 1 fagrada , que no Galeaò vinha fazendo farça do trage , procuran- \ do com grande goílo, que atè eíle opróbrio os Porruguezes tivef- ^ fem para mais os magoar, o que a Divina Mageftade fofre em fc- ;j melhantes occafiõcs pelos reípeytos a feu culto, ôc jullos juizos ■ notórios. Diífjrente termo teve Franciico Draque, Capitão In- . gles com fer Luterano , quando por batalha rendeo a Náo d?. In- | dia Saô Filippe, ( com nove Náos com que andava entre as Ilhas | dos Açores ) da qu;íl era Capitão Joaó Trigueyros ; porque tra- « zcndo-lhe da Náo hum Crticifixo de ouro, o tomou,^^ lhe tiroií o j barre- 1 Do Galeão Santiago. ||c barrete dizcado, que a fua religião lhe defendin ádoraçaôdas Ima* , gens , 6c como aquçlla era de Chrifto , 6c de ouro o poderia obri*: gar , ao qu^ fe lhe defendia , que Ibe parecia , por fe tirar de duvi* da , lançallo ao mar , 6c aíTim o fez , 6c a toda a gente da Náo d« índia deu liberdade q,ue de feus eayxões levaíTem o que fobre fuas peílbas podeíiem de vcftidos, 6c que fe lhe não empediíre,6ç aílitnt ouve homem que fobre fi levou dous veftidos , 6c pedraria,6c ou- tras coufas , 6c atè colchas , 6c alcatifas tiràraó em voltas em efcra- vos,5c quando defembarcàraó n:\ llhaTerceyra de huma urcaem que mandou lançar a gente, ataviada de todo o ncceílario , naiu parcciaõ roubados , fcnaõ que defembarcaváo da fua Náo com muy to goílo. Poílo que o Capitão João Trigueyros não quiz fa- hir fenão com o feu veftido do mar de pano de Portugal , como quem tinha razão de f.ntir o fuceílb , 6c parece que fe quiz nifta haver Francifco Draquc com cfta gente com tanto primor ha- vendo que lhe bailava huma tão grande preza , para não cobrac nome de pirata formigue yro , como fora fe a diípira > 6c fizera a que fizeram osOlandezes. E não hey dedeyxar de tocar a eftc prepofito outro primor quanto a mim bem digno de fer contado, qucufouoCondeGhiumberLand Inglês andando com humas fuas Náosentre as mefmas Ilhas, onde tomando huma urca que bia de Lisboa para a Ilha Terceyra , em que entre outros paíla- geyros hia Ventura da Mota mcyrinho geral delias com fua mq- Iher , 6c filhos em huma camará da urca com muyto fito feu. Sa- bwndo-o o Conde , ante orania ordenou que hum Capitão feu de confiança fofle diante à urca , 6c lançaífe na camará em que hia a- quella molher nobre hum cadeado , 6c que cinco palmos da porta da dita camará naõ chegafie Inglesalgum , nem fe lhe tocafle em fato que dentro ti veíFe , 6c fizeíTem conta que dentro na dita ca- mará não eftava coufa alguma por muyto que íê entenda. íTc , que podia eílar dentro , 6c aflim íe fez inviolavclmente , 6c não cum- prio ao Capitão o contrario por não paílar pelo que em f melhan- te fuccflb paíTou o Capitão Arpar que o mefmo Conde em Porto Rico mandou enforcar fcmremiflaó, fobre huma molher que de- íacatou. De modoqueamolherde Ventura da Mota efteve, 6c jfe ficou em paz na camira fechada com tudo o qut nella tinha, 6c =»em o rofto lhe vio o Capitão , nem peflpa jl^uma > çm qu nto a E ui\a 34 'Trútadockfucejfb terça fe faqucõú l Sc líirgàraõ : primores . certo dignos de nrcmoria de hum Conde Luterano , ( que he mngoa naõ fcr Catholico ) 6c ^ue o fazem tão famofo , como a Trajano fer juftiçofo Icnaó fora perfeguidor da Igreja. E tornando a noflb propoíito foraõ os do Galeaô Santiago lançados naqudla Ilha dejí^ernaó de Noronha, bufeados , ôc defpojados , ( como dito he ) fcm cama , nem coufa Gom que podcíTem reparar a vida , 6cio n Francifco de Mello ^.e Caftro deraõ huma alcatifa , em que folie levado deytâdo ,por eí* tar muyto mal das feridas , 6c a todos os efcravos que vinháo no Galeaõ deraõ liberdade, &: levàraõ comíigo paraOlanda os que fc quizeraõ ir com elics. C A P ITV L O DECIMO. X>oJítío, & qualidade da Ilha de Fernão de Noronha, & o que nella »affhu a gente do Galeão Santiago ,& comofoj ter ao Brajily C^ dahi a efts Reyno , & comofua Aiageflade tomoH a perda, & fucejfo do Galeão, DEfembarcada a noílà gente na Ilha de Fernão de Noronhni fefeznella recenha da gente, & fe achou que dos noííbs inorreraó na batalha , & fucellb delia quarenta peflbas, fendo a inayor parte efcravos , 6c dosOlandezes morrerão dezoyto. Eíla llhaeftá em três gráos, ôcdoiís terços do PoUo Antartico , difta da coíla do Brafil oytenta Jrgoas , 6c alguns querem que cento, tie 'pequena ,afpera 5 & pedragofa , tem aigús regatos de ngoa muy- to falobra, 6c roim , 6c alguns arvoredos filveííres , 6c neiíhíis dé ffuto 5 6c: muy tos de algodão, 6c naõ ha neíla ervas algumas de co- íTler , tem gado vacum , cabras , 6c porcos , tudo bravo , 6c nenhú domeílico , tem muy tos paílaros marinhos, 6c muytas rc Ihs, mais pequenas que as que arribaó a Efpanha. Eilavaó \ 3. ou 14. efcra- -vos pretos machos , 6c fêmeas , oC com cllcs hum homtm branco Portuguezpor feyror , eraó todos batizados Chriftuos no nome, mas carecentes de Sacramentos , 6c paílo efpiritual, 6c lambem de toda a charidade pela pouca , ou nenhuma , que nelles acháraó os noíTos roubados, por mais que lhe viraô padecer ncccffidades.De- fembarcados neíla Ilha , cada hii fe acomodou como pode, fazen* do choças de ramos, & camas dç feíio, apanhado tudo à maó, por- que D oGãfèan Santiago. 3j jqiic naõ tialiâo ferraraentíi alguma. D^va6-lhe os Qlandezes obra ' ^ z quacs ^ . V 'Tl atado dofucefja tjuaes concertarão do dano da batalhn, & eílando ncftes concertos^ .viraõ ao mar hiima Náo , que cuydàrao fer da Indir, & ouve entre cUes grande alvoroço de irem a ella , com tenção de a tomarem, mas ella os tirou delíe penfamento , porque fe foy governando ao Sul , & defapareceo antes dclles fazerem vella , do que fe moftra- va6 em eftremo magoados , dizendo que lhes efca pára outra Náo da índia, Padeciaó os noflbs neftes dias grandes neceílidades que naó podiaõ remediar , por naó terem com que matar gado , nem peyxe, nem paíTaros , fcnaõ eraõ huns chamados rabiforcados da fcyçaõ de minhotos , que fe mantém de peyxe , & eraó por iílb de maliílima carne, & de tal natureza , que fcnão deyxavaó depenar, fcnaó esfolar como coelhos , deíles há mu y tos , & nos primeyros dias efperavaó que ostomaílem comamaó fem fugirem , de tal Biancyra ,que trepando-fe hum homem com hú pào namaófo- bre hua arvore em que eftava grande quantidade de lies às panca- das derribou quarenta & oyto mortos , 6c mais matara fe lhe naó foraó à maõ os companheyros. Outro homem deu no campo com hú pào num deíles paflaros , & gafneando elle com a dor da pan- cada , lhe acudirão tantos que fe naó podia o homem valer, & por Xe defender dcJIes matou doze, naó durou muytoefta facilidade de tomar eíles paíTaro?, porque pondo clles cobro tm fi fe fizeraó arifcos naó fe deyxando tomar , nem com a mão, nem com o pào. O que deu cuydado àquella gente , porque fenaó eraó eltcs palfa- ros naó tinhaó com que pafiár , por a terra fer muyto efteril , fem fruta , nem erva de comer, 6c quando em mayor cuydado ell wac, começarão os campos de brotar baldrocgas cm quantidade, ÔC creceraó brevemente , das quaes faziaó palTo, cruas , 6c co fidas có os paflaros , 6c como cada hum podia , ajuntando a ifto alguns ca- ramujos , de que havia boa quantidade , como também a havia de caranguejos que criavaó, 6c habitavaóem terra fora domarem covas , por cuja razam tinhaó grande alço deíles, 6c os naó podiaõ comer. Hà também naquella Ilha grande quantidade de ratos que tem os pèstaó curtos que naóandaó,ncm correm, 6c o feu fugir, 6c meneyo he em faltos como pulgas , 6c aílim os matavão facil- mente , 6c ouve pareceres que os naó mataflcm , 6c os poupaflem para comer ,fe tal fofle a neceílidade a que receavaó chegar. Ajií* aavão-fc também de algumas t^rtaiugas , que tomavão de noyt^ de Do Gale ao Santiago] 37 de longo das prayas , faindo ellas a terra a pòr feus ovos como tem por natureza , & como fazem as hémas , que os põe, 6c encovaõ na ^rca , & nunca mais os vem , 8c alli a natureza os choca , & tira as tartarugas , ôc as hémas que por ufos depois fe criam. Deftas tar- tarugas tomàraó algúas tão grandes que naó podiaó deus homens fazer mais que levar hum quarto de húa. Tinhaõ havido à mão hum pouco de milho zaburro do feytor da Ilha a troco de camifas cue lhe derão , aílentou o Capitão mòr que o femcaffem , porque íc tal foíTe fua dilação naquella Ilha recolheffem a novidade, 6c al- íim o fizeram , 6c todo o dia o vigiavaõ dos ratos , 6c de noy te com fógos acefos, & fachos que fó para iflb faziaò, & quando fe embar- carão ficava já o milharal muyto fermofo. Deftas màs comida?, 6c da maldade das agoas daquella Ilha vieraó a inchar alguns dos pès, & outros a enfermar de febres, 8c ceíões , como foy o Capitam mòr para o qual fe ouve do feytor da Ilha húa galinha a troco de camifas , fem os Olandezçs lhe quererem dar hua das mu y tas que iicâraô no Galeão, 6c porque efta galinha em chegando acertou de pòr hum ovo , parcceo que a naó mataíTem, em quanto pozeíTe, & fe aprove ytaíTcm do ovo para o Capitam mòr , 8c para fcu filho que eftava muyto mal das feridas: 6c aíTim fe fez muytosdias, ten- do por ordem de Domingos Pereyra criado delRey que naó dcflc o ovo fenam a qual dclks viíle que tinha mayor nectílidade dcUe, Eftandoneftes extremos fabricando o fcu barco a toda a preíla, Iheefcreverão os Olandezes húa carta cuja copia me parcceo pòr nefte tratado com a própria lingoagem , 8c ortografia , 6; hc a fe- guintc. CARTA. SEnhor Capitão w cr v m, ha de pther qtíe havemos aqui entendido que Bom Felippe que andou algutis dias pai] ados com hum a c adeja de ouro o qual ha vifto nojfo geme que foy a terra , que naonos aparecer bem, naÕ por valia de c adeja por fenao por fan falaria que fez. em tia trazer , o dito cadejA ^ & façam e r/^erce de mandalla effa que fe tem viflo. O porta» dor defia que he o Meflre Simam Perez. . mande dom maflos , & cabo pa^ ra eftoupa.^ O qual naoeuver amos de mandar fenao fora por pedimento do dito Simão Pere^ , (^ que elle andafempre fuppliçando aosfenhores Capi. E 3 ' tães 5 8 . Tratado dofncejjo \ tãffs A%i*dc Ahril^ àa Náo felandiaj anm fem^ barco poder ir a ella por eltar o mar roley ro de traveííia jprometeo o Capitão mòr cincoentA cruzados a quem fe atreveíle ir a nado reconhecer a terra , como foy hum Toldado que fabia a lingua dos Braíis. o qual faindo a nado em terra ficou nella, porque aquella noyte, apertou tanto o vento que quebrou a mar- i*a á caravella, & a conllrangco ir na volta do mar , ôc o mefmo fez cm outra parte á outra caravella qus também deyxou cm cerra a Dom Manoel de la Cerda, &cJoa6 Pcreyra, os quaes caminhando acras forão ter com o Capitão mòr ao Rio Grande , onde ambas as caravellas fe ajuntarão, & onde vcyo ter o fcldado^que ficara em terra a noyte paílada contando trabalhos que paflara , cm efcapar sios Brafis que lhe correrão. As caravcllas fe partirão dalli para ef- «e Reyno fem trazerem ningucm comfigo por falta de mantimc- to, que não tinháó mais que para fua pro vifaó. Neíle Rio Grande que difta da Paraíba quarenta legoas fe .vioefta peregrina gente em aperto , por falta de mantimentos que Jiaó havia, nem os foldadosqucalli refidiaónaquelle rio os tinhaó para lhos darem , antes padeciao neceíSdadc. Acharão na novaCi- tos dias nas gra- des, & doentias calmarias daquella enfeyada de Guiné, onde lhe adoeceo do mal de Loanda toda a gente, 8c morreo quaíiamtta» de, & da que efcapou vinha a mayor parte tão doente que mal po- diaõ tomar as armas , quando chegarão às Ilhas dos Açores. E co* mo ( ftivtrão ( m fua nlcura ,ouve junta , & conf lho do que f fa- na ( fe n iS coufas , ôc fuccllb do mar o pode haver ) 6c fe averigoa por quaíi todos que Náo não ouveíle vifta do Corvo , pofto que SuaMagtftade mandava em leu regimento que abufe^ílem,6c acha» iaó ne'Ja fua Armada^ Tomado pois eíle alll nto, êc indo ca- minhando com a proa onde lhe convinha , parece que como wõ podiaó fugir da dura lòi te , dahi a três dias algús homens do mar folgazões ( que faõosque ordinariamente danaó no mar todo o bom confelho) fufpirando pelaagòa frefca ,êc fruta d?}s}lhas> paílaraó palavra com alguns foldados , que não havia de haver no- mundo não tomarem as ilhas , ôc lançando huma vòz mutinado- ra,que não havia mantimentos para paílar ao Reyno fc foraó ao Capitão mòr fazerlhe requerinnétos pacíficos que tomaíTeas llhnr, & com grandes proteftos. O.Capitãomòr que contra forma de 4^, DoftíceJJo feu regimento ns deyxava ja de tomar , pelo que fc tinha afientã»* do , U meo aquella voz publica , & pan cendo-lhe que de nam to- mar as Ilhas , focedendo- lhe al^um mào fuceílb , podia fer reprc- hendido de Sua Magtitadc pacificou a turba mutinada , íx fez fegunda junta defejofo de aceitar com o melhor confclho , ( que nunca no mar he certo fcnam dèfie do C^o , ) & como na junta havia homens de tanta expcri ;ncia tiveraó maõ no primeyi o con- lelhofe na Náo ouvelle mt diocremente mantimentos com que bufcar a coíla fem ver Ilhas ; para ifto fe viíitou a Náo por D>ogo Gomes Gramaxo , 6c Luis Leytaó pcíToas de confiança pí.ra iífo eleytos , que orçàraó , Sc balifáraõ os mandmentos , & agoa que havia , ÔC aílcntárão , que naó baftavaó para fc efcufar de tomar as Ilhas. Ifto junto ao motim ,& ao regimento , naó pode o Capitão mòr fazer outra coufa, fenaó pòr a proa no Corvo , 6c nifib vieraõ os mais , bem forçados , 6c o mefmo Capitão mòr do que enten- diaó lhe convinha, 8c poílos todos o rofto à fortuna, fe poz a Náo aponto de guerra , aíTentando todos que encontrando inimigos, ant . s fe abrazariaõ , 6c fobverteriaõ , que entregarem-fe. Com ef- ta refoluçaõ, o Capitão mòr repartio as eílancias , encomendando a popa a Dom Rodrigo de Córdova , 6c a proa a António das Po- voas 5 6c o coHvez a Brás Corrêa , ficando o Capitão mòr no lugar perpào. Nuno Velho naó quiz lugar certo pedindo ao Capitão mòr o deyxaíTc livre para acudir onde mais neceflidade ville , 6r iiefia liberdade ficarão algús Capitães, Ôc por fim Nuno Velho no tempo da batalha lançou mão do capiteo , lu^ar depois muyto a- cometido dos inimigos , outros cfcolhéraó a proa com António das Povoas, por fer lugar muy importante. Gompnndo o Capi- tão mòr com o que lhe tocava , no provimento das eílancias , 6c repartição da gente , 6c provido miniftros, 6c Capitães para as ga- vins, 6c Diogo Gomes Gramaxo, para o cuydado da polvorn,que he COU& de grande confiança nas batalhas do mar ; comprio tam- bém a Náo com feu caminho, 6c chegou à vifta do Corvo que naó pode ferrar pelo vento contrario ,6c indo na volta do Fayalem vinte , 6c dous de Junho do «nno de 1 594. ouve vifta de três Náos groflas conhecidas logo pòr Inglezas, 6c erão todas dum porte, de t.re?:entas , para quatrocentas toneladas , 6c huma delias do Conde Çbiumber Land, das quaes era General Ckeve Capitão de Infan- taria, Da Nao Chagas. ' 49I taria,& fcu Almirante o Capitão Antonio.Eftavaõ guarnecidas de muytti gente de guerra, 6c muyti artilharia grofla de bronze de q cada Náo tinha duas andai nas , em que entra vaô canhões reforça-^ dos debater, 6c de muytas armas ,& petrechos de guerra ,6c eraõ Náosde forte, que podia cada húa fó por íi combater com a noflk I^áo Chagas , cuja gente vendo chegada a hora já tantos dias an* te viíla, ôc que fu i forte naò fora outra , tornarão a paífar palavra, que fenaõ rendiriaô fem primeyro renderem as vidas, ÔC o mar , 6c fcgo comsfle a Náo, ôc com efta determinação dos mais valeroío?, algus fe o naõ eraó vieraõ nclla, dando fim a fua forte, ôc máo gra- do á fortuna , encomendando cada hum fua alma a Deos , Ôc che- gada a hora do meyo dia fc travou com os inimigos hua cruel , & medonha batalha de bombardas , 6c mofqueces , fem em todo a- quelledia,6ctodaafeguintenoyteatèao outro àn, cm todas a- quellas vinte & quatro horas haver , hora nem momento , cm que ceífaíTe a terribel bateria, com muytos mortos de parte a parte^ lendo a noíla Náo mais acometida , ÔC maltratada pela popa , onde lhe fentiaõ menos artilharia , 6c aonde por eíla falta lhe foy poílo de noyte hum falcaò em cima^^Çc na tolda fe abrio húa portinhola para húa peça de artilharia,que fe nella poz com trabalho , 6c fez- fe preítss alcançou-a dos bombardeyros, 6c aliftáraó-feas duas peças do leme, que vmhaô recolhidas por haver poucos bombar- deyros,pelos muytos que fe haviaó mortos da doença de Loanda, ik na batalha já nefte tempo aigús , de tal maneyra que Nuno Ve- lho Pcreyra, Pedro de Alvellos da Coíla, 6c António Godinho,6C Brás Corrêa fervirãá de bombardeyros. Vendo os inimigos a Náo armada por popa, donde erão muy to ofifendidos , pela grande dili- gencia com que fe meneavaó nella aquellas poucas peças , 6c dc^, ienganando feque naõ fariaõ com ella effeyto ás bombardadas, antes lhes tinha já aelles morta muyta gente, fe ajuntarão todas as três Náos , 6c aílèntando que balroaílcm a noíla Náo , a in- viftiraõ a horas do meyo dia , f. a Capitania tomou a Náo pelo meyo, 6c a Almiranca pela popa, 6c a Náo deChiumber Land , pela proa atraveílada : inviftidas aílim todas trcs , fe difpa- rou artilharia de parte a parte, com roqueyras, pelouros de cadea, Sede picões, houve em todos grande cftrago, juntamente coma moíquetaria, 6c munição das gavias choviaõ as pançllas, 6c aican-, G zias js^, ^r'DofuceJJõ asias de fogo \ os dardos, Sc pedras , 6c pelos bordos árdiao as bom- bas , Sc lanças de fogo , caindo de todas as partes muy tos mortos, íc feridos, eftando todas as quatro Nàos fcytas hum vivo incên- dio, & rios de fangue , quaes erão os fortes combatentes , & atcy- ipados Inglezcs pela preza , & dos Portuguezes pelos defengana- rem delia. O mar eftava roxo com fangue cabido dos embornáes^ qs convczes juncados de mortos , &: o fogo ateado nas Náos por alguas partes , o ar taó occupado com fumaílas , que naó fó fenaò çnxergavaó huns, êc outros, mas mal fe conheciaõ muytos de tifnados,& mafcarrados do fogo , ôc pólvora. Os da Ilha do Fayal que viraõ enviílir eftas Náos , as naó enxergarão durante a bata- lha , porque as cubrio húa grofla nuvem , negra de fumaíTas, den- tro na qual ouviaõ os tcmerofos eftrondos da batalha , com que Dom Rodrigo de Córdova foy efpedaçado pelas pernas dum pe- louro de bombarda , cm que moftrou tanto valor , que levando-o para bayxo morrendo levantou a voz , diz ndo : fenhores iílo re- cebi em mcuofficiojhaja bom animo, & ninguém defempare feu lugar , 6c antes abrazados que rendidos. Socedeo-lhe na popa Pe- dro de Alvt lios da Cofta, raõvalerofo foldado,qual depois pare- ceo aos inimigos , que por ella cometerão a entrada , começando pelo perpáo,aonde Nuno Velho acudio com hualcínçade fogo,6c ajudado de Luis Leytaõ, & Mel hior Martins do Barreyró , com qutras , os fizcraó retirar , pondo- lhe o fogo ni fua vclla \ aonde também acudio Pedro de Alvcllos com l.uma efpada larga , cujos fio3 os inimigos provarão , & atè a relinga da fua vcJla lhe cortou com cila. Retirados os Ingíezes da arremetida , 8: mà entrada que £zcraó,os começou Pedro de Alvcllos de apertar com o f ilcaó da popa , com roqueyras de pelouros , ajudado do Mcftrc , 6c piloto;, ôc fotapiloto , que naó oufava algum aparecer, nem drfcubrirfe, pelo grande dano que reccbiaó. Os Inglezcs da Capitania-, por emendarem o mào fuceílb da entrada dos da Almiranta, comt:tc- raõ duas vezes a entrada pela xareta , com tanto impcto , òc coníi^ anca, como fe na Náo não ouverajà quem lhe refiftirai porètn Brás Corre?, que no conviz eftava com a fua quadrilha,os rccebeo de modo , 6c juntamente Nuno Velho decima da popa com fcus companheyros , 6c António de Povoas com os feus da proa , que* por mais que os Inglezcs trabalharão, por fe retirarem , o naô po- ^y..i, . ^ dcráo Dã^aoCbãga^. ff deraô fazer toios, fem alguns com apreíla cahiretn aofííar, 8c ou*? jros ficarem mortos na xareti , 6c 03 que efcapárão, defenganadoí ^e tornarem lá. Em huma deftas entradas foy morto Mílchior J^lartins do Bírreyro com huma mofquetada tendo mortos algús Inglezes, ôc em feu lugar entrou na popa Bento Galdeyra pôr ordem do Capitão mor , que com grande cuydado corria , ôc pro* Via as neceííidades , defenganando a todos que a Náo fenaó entre?- garia fem primeyro morrerem todos , ôc animando-os com gran? de valor. Os Inglezes da Náo da proa parecendo-lhe que naó pumpriaõ com fua obrigação fem fazerem também entrada,come<-' ^terao hiia que lhe cuílou taó cara , quaes eraó os combatentes que deiendiaô aquelle lugar , os quaes naquclla Náo inimiga que lhe iícava atraveílada, fizeraó noravel dano , & havendo os Inglezes áh. Capitania , que eftando pelo bordo , ôc razo da xareta , naó fa- ziaõ o que deviaó fem render por alli a Náo , cometerão terceym entrada com grande impetomuy cubertos de rodei las de aço,6c .capacetes , 6c outras boas armas , deliberados a morrer, ou render .a*Náo, 6c levantarão na xareta da noíla Náo bandeyra branca de ^az , parecendo-lhes que os noílbs folgariaõ abraçarfe com ella,6c o primeyro que os noflbs matàraõ foy o da bandeyra, atempo que já da nolla Náo o forapiloto João da Cunha levantou da pQ« pa outra bandeyra branca , a qual Nuno Velho, 6c os do capiteo, lhe romperão logo, 6c lançarão ao mar , querendo-o matar a elle pelo atrevimento , dizendo-lhe que o negocio fcnaô havia de ave- riguar com bandeyra branca,fcnaó de Tangue , 6c morte de todos, :& que fe defenganaffem os Inglezes, 6c em todas as eftancias cor- ria o mefmo voto , pofto que alguns mercadores que. alli vinhao .defejavaõ mais paz , do que folgavaó de ver tanto Tangue , & co- ,ineçou de correr huma palavra , que Te hia a Náo ao fuado , 6c lo^ go outra que ardia a Náo ,6c ouviaó-Te os ecos: abráze-Te, vaTe ao fundo, mas mó Te ande entregar. Retirados os Inglezes que eTca- párão da entrada , abriga Te porfiava como Te Te começara , Tenài haver em que pòr olhos Tenaó em mortos, fogo,6c Tangue , atordi- dos todos do grande eftrondo , 6c com húa Tanha , 6c braveza tei^ Tivel,6cduas vezes. Te pegou, 6c apagou o fogo nu Capitania ini- miga , 6c húa vez na Náo da proa que ,íe afaftou ardendo Tem re*- 4?j^4io,j.ma5.a tempo queomeTmo fogo tinha AUadouo coxim -;J,:-^\. G 2 decay- |< Dofuce^ decayro da nofla Náo que tinha no guropez para guarda da vella do trâquete,queosnoflbsíè defcuydàraó de lirar (inadvertên- cia que lhes cuítoú taó caro , que naó cuftàra fe efte coxim naó fo- ra , porque citando os inimigos já de todo defenganados de vito-í ria , defejofos de fe poderem defembaraçar dos nollbs , foy tal íi fúria do fogo no coxim por eftar muy feco do Sol, & guarnecido, -& cercado de alcatroados, & foraó taó altas as chamis, que le atea- rão na vella , ôc por ella acima atè gavia como por eílopas , abra- zando , vella , enxárcia , 6c gavia , com tanto impeto,6c brevidade que fc lhe naó pode atalhar , porque além de naó terem para iílb ordem , nem inftromento com que lançar a agua tam alta ( como devia de haver em femelhantes Náos; porque os ha.) Os inimigos da Náo da proa, cm quanto fe foy afaftando âs mofquetadas mata- vaõ qualquer dos noflbs que apparecia para apagar o fogo, porque nem com elle affim ateado ceifava a batalha de parte a parte , atè que as Náos inimigas fe afaftáraó bem , havendo grandes quatro horas , que eftavag abordados , 6c deraó lugar aos noíTos remete- rem apagar o fogo, 6c os noílbs a elks para fc afaftarem, por evita- rem ao perigo cm que fe viaõ j mas foy illo já a tempo íem remé- dio algum j porque além de fe ter o fogo apoderado da gavi animado o moço que eftava na diantcyra dopào, rcmcteo cora a lancha , 6c entrou , & elles o recolherão: os mais forão cometeu-^ do , 8c entrando , & Brás Corrêa também , Matanàos lançou hua* corda do feu rebem a Nuno Velho que eftava pofto na curva , 8c puxando por elle para o gorupez o ajudou a pòr nelle , 6c lançan-> do a correr fe foy meter na lancha, que com grande prefia fe afaf- tou delle , temendo que cheg^ifle o fogo da Náo à pólvora , 6c vo-í" ando as cubertas os alcançaílem. Brás Corrêa vendo ficar Nuno Velho no gorupez fez grade inftancia com os da lancha que o to*; inaflem , porque lhe montaria muyto o que por fi lhe daria , 6c o nãoquizerão fazer com o grão temor que tinhaõ do fogo , mas» bradarão a outra lancha que também vinha fugindo que o tom-rií- lem.como tomáraõ^6c logo o defpiraó da roupeta , 6c lhe tomáraõ hum relicário, 6c ni^i o paftáraõ ã outra lancha, que era da Náo do Chiumber Land , onde foraó levados , 6c nefta forma fe falváraó treze peíToas, convém a faber: NunoVelho,BrasCorrea,6c Gon- çalo Fcrnandez Guardião da fua Náo Nazareth,6c o Eftrinquci- ro António Dias, 6c Pedro Dias foldado da índia , 6c dous calafa^ tes,6c dous marinheyros , 6c quatro , ou cinco efcravos. Os quacs da Náo inimiga viraõ acabar de arder a fua , atè que já qiíafi no ytd chegou o fogo á pólvora , que com horrendiílimo cftrondo .le- vantando húa grande nuvem de fumo , feconcluhio aquclle cfnc* íbaculo , indo-fe o cafco ao fundo , 6c acabando de perecer os que por feu bordo ainda eftavaõ pegados: cujas almas permitiria Deos levar fó DofuceIJo levar logo á ff loria ,pois permitioque fcus corpos paflaílcm por tal craníito.Dos treze lançarão os Inglezes os onze na llhadasFlo- res , 6c Nuno Velho , ôc Brás Corrêa leváraõ comfígo por fercni- Capitães para teílemunho do fuccílb , & por efperarem dellesref* gate 5 porém trataraó-nos muyto mal com todos os difpri mores,' èc máos tratamentos poíliveis. Na batalha morrerão logo perto de noventa Inglezes , ficáraõ como cento 6c cincoenta^muyto mal feridos,dos quaes foraõ depois morrendo muytos cada dia,6c mor- rco na briga o Capitão António Almirante, 6c o General Ckeve fi^ cou taõ mal ferido nos joelhos, que nunca mais Çc ergueo da cama, Zl foy diílb morrer a Inglaterra. O Capitão da outra Náo do Chi- umber Land , foy paílado pela barriga de húa arcabuzada de que depois em Inglaterra muyto tempo andou mal , 6cparmavaó que taõ pouca gente como era a da noíTa Náo lhes podeílem matar tanta gente : fendo os noílbs quando muyto fetenta homés Por- tuguezes pelos muytos que lhe morrerão na viagem do mal de Loanda, porque pofto que os efcravos eraõ muytos,craõ boçaes,6c defmazelados , 6c fó quatro, ou cinco dellés preíláraõ para armas. Aflim ferido á morte fe deyxou o General Ckeve andar en- tre as Ilhas mais de hum mezefperandofuceílb de preza,corrido de haver de parecer fem ella em Inglaterra , coin tanta perda de gente, atè que húa manhã viraò a Náo Capitania da índia Capi- tão mor Dom Luis Coutinho , com o qual pelejarão às bombar- dadasaquellsdia^atèque o General Ckeve mandou atar Nuno Velho, 6c Brás Correa,6c metellos em huma lancha que enviou a Dom Luis dizendo, que amainaíle da parte da Rainha de Ingla- terra, fenaó que lhe queyraaria a Náo , como fizeraõ á Náo Cha- fas , para cujo teílemunho lhe moftravaó alli os Capitães Nuno ''elho, 6c Brás Corrêa, que delia efcapáraó. Dom Luis mandou á lancha que falaíle de largo , 6c refpondeo á embayxada , que elle naó conhecia a Rainha de Inglaterra , fcnaõ a ElRey de Efpanha Dom Felippe noflb fenhor cuja era aquella Náo Capitania da car- leyra da índia, 6c Capitão mòr delia Dom Luis Coutmho, que na ilha do Corvo tomara, 6c desbaratara a Richarte de Campo Verde General Inglez , 6c que dixeílem ao feu General que íizef- fe o que podeíle , que cllé lhe refponderia em forma , 6c que clie- gafle a bordo, porque a Náo vinha carregada de muyta riqueza, 6c Da Nào Chagas. "^^ Òc pedraria. O Inglez vendo a repofta dçtcrmínõu dé queymar a Náo,Ôc para iílb mandou que logo íc defpejaíle a Náo de Chium- ber Land,por fer velha,6c que lhe fobrecarregaAem toda a artilha-, ria > 6c levando dentro em ú dez peílbas para a marearem , com z lancha por popa em que fe fahiílem , depois de abordada, ôc ferra- da com arpèos deyxando efpias acefas na pólvora , 6c que reme- tendo todas três Nàos com a noíTa , aquella fò balroaílcm na dita forma : para que ambas feabrazaílem. Tomado eftc aílento, orde- nou Deos outro ; porque continua ndo-fe aquella tarde a batalha, ás bomba rdadas,deraó da noíla Náo hiía bombardada no mafto da traquete da Náo do Conde com que lho quebrarão , 6c apoziílb fobrevcyo húa trovoada, com que a noflá Náo fe foy faindo , 6c ag duas a poz cila, as quacs Dom Luis aquelh noy te fez fiu'ol, 6c co- mo amanheceo naó viraõ a outra, que por naó ter mafto não pode velejar, tornáraõ-feaella,difiílindo da contenda, 6c leguio Dom Luis fua viagem em paz. Porque quando Deos quer, tudo ordena como cumpre. Ckeve enfadado dos máos fuceílbs , 6c muyto mais da morte que o apertava pela ferida dos joelhos, fe foy na volta de Inglater- ra, onde em breves dias morreo , 6c onde Nuno Velho , 6c Brás Corrêa foraó prifioneyros do Conde Chiumber Land,que os tra- tou muyto bem, tendo-os por hofpedes hum anno, em que fe ref» gatáraó por três mil cruzados,os quaes Nuno Velho pagou fó por ambos, naõ querendo que Brás Corrêa pagaíle nada delles,6c vin- dos a Efpanha Sua Mageftade lhes fez algumas mercês , 6c a Brás Corrêa tornou a inviar à índia por Vedor da fazenda de Goa nei* teannode 1604. C A P TTV L O V N T C O. Dá canfa , & defaftres ^porqne (e perderão rnupas Nàos dá Indiá; HE coufa que muyto magoa coníiderar na perda de tantas Náos defta carreyra da índia , 6c quaíi todas por defaílres,6c cobiça infaciavel : 6c naó quero dizer o porque mais. Sò digo que os que andaó nella ponhaó os olhos cm quantos perderão vidas,6c fazendas , 6c o porque , 6c fe advirtaó do que lhes cumpre ncíla raatcrií|, 6c naõ chamo defaftrcs às que tomàraõ osCoçarios,6c H fizcraS jS Dofuceffo flzeraõ perder ; porque iflb faó cafos fortuitos de guerra, como vi- mos na Náo SaõFcUippe que Frandfco Draque tomou entre a Jlha Terceyra, & de Saõ Miguel com nove Náos de guerra, nem a Nào Madre de Dcos, que na Ilha das Flores tomou outra efqua* dra Ingleza , nem a Náo Santa Cruz,que por lhe efcapar das mãos à mefma Armada , deu comfigo à cofta namefmallha , 6c fc pozo fogo para o inimigo dclk naô levar nada , como naõ levou .Nem a Náo Saó Fran ifco que vindo de arribada no anno de 97. deu co- ligo àcofta na Ilha de Saõ Miguel por fe livrar de 140, vellas de Armada Ingleza, nem chamo defaftrr o da Náo Saõ Vakntim que ancorada em Cezmabra no anno de i6o%. foy alli tomada de In- glezes , nem menos a naveta Santo Spirito que fahindo de Lisboa para a índia íó em Outubro , ou Janeyro do anno de 1590. a to- marão Coçarios às bombardadas : 6c fe no que fica contado do Galeaõ Santiago,8c da Nào Chagas fe pôde atribuir algú defaftre, do difeurfo da hiíloria fe deyxará coligir , que o que eu ent^ n lo da Nào Chagas defaftre foy pegarfé o fogo pelo coxim , & naõ íe advJrxirem dellc para o tirarem antes da batalha; porque em fcme- Utmtcê fuceílbs o Capitão do fogo ha de fer muy advertido , em *afaltar itodo o modo de acendalha : eíla he a razaó , porque logo cbnvèm tirar as monetas das vellas , naõ íó para defembaraçarem a vifta , mas para ficarem levantadas as vell is do fogo , nas quaes he fempre mais perigo fo , porque fcnaó pôde apagar como vmios ncfta Nào. Defaftre bem fentido foy partirfc da Índia Manoel de Soufa Sepúlveda , naõ fó tão tarde como pai tio em dous de Fcve- rcyro do anno de 1552. de Cochirr,que era o t.mpoem que para bem ouvera dcftar no cabo de boa Efperança , mas partio-fj fem vellas , com huas vellas, que para as remendar amainou tancas ve- zes, que poz atè treze de Abril que laõ dous mczes, & dez dias, em chegar a trinta , & dous gràos no cabo fendo já inverno nelle, on- de fe perdeo : & mayor defaftre foy entregar as armas aos Cafres, que tão caro lhe cuftou a elli^ & molhcr, & filhos , & a todos. De- faftre grande foy o da Nào Santiago Capitania que deu no bayxo daludia, fendo bayxo taõ conhecido. Defiftre foy também dar á cofta na Ilha Terceyra o Galeaõ Santiago vindo de Malaca o an- no de 98. fem tormenta, & por falta de amarra, que naõ tinha: ef- tando no mcfmo porto íeis Nàos de viagt m de íjue era Capitão mòr Da Não Chagas. jp mor João deTomar Caminha,& o Galeão Saõ Lucas Capítama da frota do Brafil de q era Capitão mòr Brás Corrêa , 6c nenhú deu i coita fenaó o dito Galeão por naó ter amarra. Dezaftre feja também perderfc a Náo Saó Luis no parçal de SoíFalIa no anno de lySz, indo de viagem para a índia , por roim pilotagem. Dezaftre foy^ bem grande o da Náo noíTa Senhora da Encarnação , que no an- no de 96. levou de Lisboa à índia o Conde da Vidigueyra Almi- rante j porque tendo-a no porto de Cochim carregada para fe vir nella para o Reyno o Vifo-Rey Mathias de Albuquerque , ardeo aííim carregada por occaíiaó de íe chegar a ella hum barco em que fe ateou o fogo , levando barris de pólvora , & de alcatrão , 6c poi; mão tento ardco a Náo carregada , ôcmorreo nella alguma gente.' Também feja dezaftre partir de Goa a Náo nofla Senhora do Caí* tello para a índia , & irfe perder fetenta legoas das Ilhas de Ango» ja , a través de Moçambique , onde foy ter o Capitão com alguma gentc',ôc naõ foy menor defaftre o da Náo Madre de Deos fey ta na lndia,què partindo de Goa para efte Reyno no anno de 1^99; ^^^ treze dias de viagem fo)7 dar nos bayxos das def.rtas de Arabia,dc que fó dezaíeis pefloas fe fal vàraó , 6c os mais matarão os A rab''>s.' Seja também dezaftre de três Nàos que partirão de Lisboa para; ,a índia, a faber: a Náo Santo António no anno de 1589. ( que di^ zem que ardeo ) 6c o Galcaó São Lucas no anno de i5'90.6c o Ga»' leaó Saó Felippe no anno de 1600. fem de nenhuma delias haver juais novas, nem como fe perde íle m , mais que defapareceremj Porém ainda que todas as Náos jà nomeadas podemos coligir que quaG todas fe perdeíTem por dezaftres , as outras que agora íe fc- guem não por dezaftre , mas por cobiça fe perderão, que he mal antigo , & conhecido nefta carreyra , 6c de todos chorado , & de ninguém remediado , fendo o remédio diífo tão neceílario, coma he haver Náos, & miniftros para cilas, porque realmente pela mayor parte nefta carreyra anda gente de infacíavel cobiça. & tal^ que do naufrágio da Náo Santiago no bayxo da ludia , fe conta que vendo hum, grande foma de reaks de oy to lançados por cima do bayxo , não havendo nelle eíperança de falvação , tomou hua facca grande, 6c os apanhou todos , 6c metco na facca , 6c a atou, 6c não tardou muyto que a maré enchendo cobrio a facca, 6c a cíle, & a todos 'afogou. Dq hum iiiarinheyro da Náo Santa Clara que Ha ' deu